PEDAGOGIA
1-
Jean-Jacques
Rousseau
Em sua obra sobre educação, o
pensador suíço prega o retorno à natureza e o respeito ao desenvolvimento
físico e cognitivo da criança
Frases de Jean-Jacques Rousseau:
"A
instrução das crianças é um ofício em que é necessário saber perder tempo, a
fim de ganhá-lo"
"Que
a criança corra, se divirta, caia cem vezes por dia, tanto melhor, aprenderá
mais cedo a se levantar"
Jean-Jacques Rousseau nasceu em
Genebra, Suíça, em 1712. Sua mãe morreu no parto. Viveu primeiro com o pai,
depois com parentes da mãe e aos 16 anos partiu para uma vida de aventureiro.
Foi acolhido por uma baronesa benfeitora na província francesa de Savoy, de
quem se tornou amante. Converteu-se à religião dela, o catolicismo (era
calvinista). Até os 30 anos, alternou atividades que foram de pequenos furtos à
tutoria de crianças ricas. Ao chegar a Paris, ficou amigo dos filósofos
iluministas e iniciou uma breve mas bem-sucedida carreira de compositor. Em
1745, conheceu a lavadeira Thérèse Levasseur, com quem teria cinco filhos,
todos entregues a adoção - os remorsos decorrentes marcariam grande parte de
sua obra. Em 1756, já famoso por seus ensaios, Rousseau recolheu-se ao campo,
até 1762. Foram os anos em que produziu as obras mais célebres (Do Contrato
Social, Emílio e o romance A Nova Heloísa), que despertaram a ira de
monarquistas e religiosos. Viveu, a partir daí, fugindo de perseguições até
que, nos últimos anos de vida, recobrou a paz. Morreu em 1778 no interior da
França. Durante a Revolução Francesa, 11 anos depois, foi homenageado com o
translado de seus ossos para o Panteão de Paris.
Na história das idéias, o nome do
suíço Jean-Jacques Rousseau (se liga inevitavelmente à Revolução Francesa. Dos
três lemas dos revolucionários - liberdade, igualdade e fraternidade -, apenas
o último não foi objeto de exame profundo na obra do filósofo, e os mais
apaixonados líderes da revolta contra o regime monárquico francês, como
Robespierre, o admiravam com devoção.
O princípio fundamental de toda a
obra de Rousseau, pelo qual ela é definida até os dias atuais, é que o homem é
bom por natureza, mas está submetido à influência corruptora da sociedade. Um
dos sintomas das falhas da civilização em atingir o bem comum, segundo o
pensador, é a desigualdade, que pode ser de dois tipos: a que se deve às
características individuais de cada ser humano e aquela causada por
circunstâncias sociais. Entre essas causas, Rousseau inclui desde o surgimento
do ciúme nas relações amorosas até a institucionalização da propriedade privada
como pilar do funcionamento econômico.
O primeiro tipo de desigualdade,
para o filósofo, é natural; o segundo deve ser combatido. A desigualdade nociva
teria suprimido gradativamente a liberdade dos indivíduos e em seu lugar
restaram artifícios como o culto das aparências e as regras de polidez.
Ao renunciar à liberdade, o
homem, nas palavras de Rousseau, abre mão da própria qualidade que o define
como humano. Ele não está apenas impedido de agir, mas privado do instrumento
essencial para a realização do espírito. Para recobrar a liberdade perdida nos
descaminhos tomados pela sociedade, o filósofo preconiza um mergulho interior
por parte do indivíduo rumo ao autoconhecimento. Mas isso não se dá por meio da
razão, e sim da emoção, e traduz-se numa entrega sensorial à natureza.
Dependência das coisas
Rousseau via o jovem como um ser
integral, e não uma pessoa incompleta, e intuiu na infância várias fases de
desenvolvimento, sobretudo cognitivo. Foi, portanto, um precursor da pedagogia
de Maria Montessori (1870-1952) e John Dewey (1859-1952). "Rousseau
sistematizou toda uma nova concepção de educação, depois chamada de ‘escola nova’ e que reúne
vários pedagogos dos séculos 19 e 20", diz Maria
Constança.
Para Rousseau, a criança devia
ser educada sobretudo em liberdade e viver cada fase da infância na plenitude
de seus sentidos - mesmo porque, segundo seu entendimento, até os 12 anos o ser
humano é praticamente só sentidos, emoções e corpo físico, enquanto a razão
ainda se forma. Liberdade não significa a realização de seus impulsos e
desejos, mas uma dependência das coisas (em oposição à dependência da vontade
dos adultos). "Vosso filho nada deve obter porque pede, mas porque
precisa, nem fazer nada por obediência, mas por necessidade", escreveu o
filósofo.
Um dos objetivos do livro era
criticar a educação elitista de seu tempo, que tinha nos padres jesuítas os
expoentes. Rousseau condenava em bloco os métodos de ensino utilizados até ali,
por se escorarem basicamente na repetição e memorização de conteúdos, e pregava
sua substituição pela experiência direta por parte dos alunos, a quem caberia
conduzir pelo próprio interesse o aprendizado. Mais do que instruir, no entanto,
a educação deveria, para Rousseau, se preocupar com a formação moral e
política.
Bom selvagem
Até aqui o pensamento de Rousseau
pode ser tomado como uma doutrina individualista ou uma denúncia da falência da
civilização, mas não é bem isso. O mito criado pelo filósofo em torno da figura
do bom selvagem - o ser humano em seu estado natural, não contaminado por
constrangimentos sociais - deve ser entendido como uma idealização teórica.
Além disso, a obra de Rousseau não pretende negar os ganhos da civilização, mas
sugerir caminhos para reconduzir a espécie humana à felicidade.
Não basta a via individual. Como
a vida em sociedade é inevitável, a melhor maneira de garantir o máximo
possível de liberdade para cada um é a democracia, concebida como um regime em
que todos se submetem à lei, porque ela foi elaborada de acordo com a vontade
geral. Não foi por acaso que Rousseau escolheu publicar simultaneamente, em
1762, suas duas obras principais, Do Contrato Social - em que expõe sua
concepção de ordem política - e Emílio - minucioso tratado sobre educação, no
qual prescreve o passo-a-passo da formação de um jovem fictício, do nascimento
aos 25 anos. "O objetivo de Rousseau é tanto formar o homem como o
cidadão", diz Maria Constança Peres Pissarra, professora de filosofia da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. "A dimensão política é
crucial em
seus princípios de
educação."
Não há escola em Emílio, mas a
descrição, em forma vaga de romance, dos primeiros anos de vida de um
personagem fictício, filho de um homem rico, entregue a um preceptor para que
obtenha uma educação ideal. O jovem Emílio é educado no convívio com a
natureza, resguardado ao máximo das coerções sociais. O objetivo de Rousseau,
revolucionário para seu tempo, é não só planejar uma educação com vistas à
formação futura, na idade adulta, mas também com a intenção de propiciar
felicidade à criança enquanto ela ainda é criança.
Método natural e educação
negativa
Rousseau dividiu a vida do jovem
- e seu livro Emílio - em cinco fases: lactância (até 2 anos), infância (de 2 a
12), adolescência (de 12 a 15), mocidade (de 15 a 20) e início da idade adulta
(de 20 a 25). Para a pedagogia, interessam particularmente os três primeiros
períodos, para os quais Rousseau desenvolve sua idéia de educação como um
processo subordinado à vida, isto é, à evolução natural do discípulo, e por
isso chamado de método natural. O objetivo do mestre é interferir o menos
possível no desenvolvimento próprio do jovem, em especial até os 12 anos,
quando, segundo Rousseau, ele ainda não pode contar com a razão. O filósofo
chamou o procedimento de educação negativa, que consiste, em suas palavras, não
em ensinar a virtude ou a verdade, mas em preservar o coração do vício e o
espírito do erro. Desse modo, quando adulto, o ex-aluno saberá se defender
sozinho de tais perigos.
Para pensar
Por
incrível que pareça, Rousseau, ao criar o mito do bom selvagem, acabou dando
argumentos para negar a importância ou o valor da educação. Afinal, a educação
é antes de tudo ação intencional para moldar o homem de acordo com um ideal ou
um modelo que a sociedade, ou um segmento dela, valoriza. A educação aceita a
natureza, mas não a toma como suficiente e boa em princípio. Se tomasse, não
seria necessária... Se você comparar, por exemplo, as idéias de Rousseau e as
de Émile Durkheim (1858-1917), verá que, nesse sentido, eles estão em extremos
opostos. Para o sociólogo francês, a função da educação era introduzir a
criança na sociedade.
PEDAGOGIA
2-
Jean
Piaget
O cientista suíço revolucionou o
modo de encarar a educação de crianças ao mostrar que elas não pensam como os
adultos.
Piaget acreditou e comprovou que o
conhecimento vem das descobertas que a criança faz .
Frases de Jean Piaget:
“O
conhecimento não pode ser uma cópia, visto que é sempre uma relação entre
objeto e sujeito”
“Se o
indivíduo é passivo intelectualmente, não conseguirá ser livre moralmente”
Jean Piaget nasceu em Neuchâtel,
Suíça, em 1896. Aos 10 anos publicou seu primeiro artigo científico, sobre um
pardal albino. Desde cedo interessado em filosofia, religião e ciência,
formou-se em biologia na Universidade de Neuchâtel e, aos 23 anos, mudou-se
para Zurique, onde começou a trabalhar com o estudo do raciocínio da criança
sob a ótica da psicologia experimental. Em 1924, publicou o primeiro de mais de
50 livros, A Linguagem e o Pensamento na Criança. Antes do fim da década de
1930, já havia ocupado cargos importantes nas principais universidades suíças,
além da diretoria do Instituto Jean-Jacques Rousseau, ao lado de seu mestre,
Édouard Claparède (1873-1940). Foi também nesse período que acompanhou a
infância dos três filhos, uma das grandes fontes do trabalho de observação do
que chamou de "ajustamento progressivo do saber". Até o fim da vida, recebeu
títulos honorários de algumas das principais universidades européias e
norte-americanas. Morreu em 1980 em Genebra, na Suíça.
Jean Piaget foi o nome mais
influente no campo da educação durante a segunda metade do século 20, a ponto
de quase se tornar sinônimo de pedagogia. Não existe, entretanto, um método
Piaget, como ele próprio gostava de frisar. Ele nunca atuou como pedagogo.
Antes de mais nada, Piaget foi biólogo e dedicou a vida a submeter à observação
científica rigorosa o processo de aquisição de conhecimento pelo ser humano,
particularmente a criança. Do estudo das concepções infantis de tempo, espaço,
causalidade física, movimento e velocidade, Piaget criou um campo de
investigação que denominou epistemologia genética – isto é, uma teoria do
conhecimento centrada no desenvolvimento natural da criança. Segundo ele, o
pensamento infantil passa por quatro estágios,
desde o nascimento até o início
da adolescência, quando a capacidade plena de raciocínio é atingida.
“A grande contribuição de Piaget
foi estudar o raciocínio lógico-matemático, que é fundamental na escola mas não
pode ser ensinado, dependendo de uma estrutura de conhecimento da criança”, diz
Lino de Macedo, professor do Instituto de Psicologia da Universidade de São
Paulo.
As descobertas de Piaget tiveram
grande impacto na pedagogia, mas, de certa forma, demonstraram que a
transmissão de conhecimentos é uma possibilidade limitada. Por um lado, não se
pode fazer uma criança aprender o que ela ainda não tem condições de absorver. Por
outro, mesmo tendo essas condições, não vai se interessar a não ser por
conteúdos que lhe façam falta em termos cognitivos.
Isso porque, para o cientista
suíço, o conhecimento se dá por descobertas que a própria criança faz – um
mecanismo que outros pensadores antes dele já haviam intuído, mas que ele
submeteu à comprovação na prática. Vem de Piaget a idéia de que o aprendizado
é construído pelo aluno e é sua
teoria que inaugura a corrente construtivista. Educar, para Piaget, é “provocar
a atividade” – isto é, estimular a procura do conhecimento. “O professor não
deve pensar no que a criança é, mas no que ela pode se tornar”, diz Lino de
Macedo.
Assimilação e acomodação
Com Piaget, ficou claro que as
crianças não raciocinam como os adultos e apenas gradualmente se inserem nas
regras, valores e símbolos da maturidade psicológica. Essa inserção se dá
mediante dois mecanismos: assimilação e acomodação.
O primeiro consiste em incorporar
objetos do mundo exterior a esquemas mentais reexistentes. Por exemplo: a
criança que tem a idéia mental de uma ave como animal voador, com penas e asas,
ao observar um avestruz vai tentar assimilá-lo a um esquema que não corresponde
totalmente ao conhecido. Já a acomodação se refere a modificações dos sistemas
de assimilação por influência do mundo externo. Assim, depois de aprender que
um avestruz não voa, a criança vai adaptar seu conceito “geral” de ave para
incluir as que não voam.
Ajudando o desenvolvimento do
aluno
A obra de Piaget leva à conclusão
de que o trabalho de educar crianças não se refere tanto à transmissão de
conteúdos quanto a favorecer a atividade mental do aluno. Conhecer sua obra,
portanto, pode ajudar o professor a tornar seu trabalho mais eficiente. Algumas
escolas planejam as suas atividades de acordo com os estágios do
desenvolvimento cognitivo. Nas classes de Educação Infantil com crianças entre
2 e 3 anos, por exemplo, não é difícil perceber que elas estão em plena
descoberta da representação. Começam a brincar de ser outra pessoa, com
imitação das atividades vistas em casa e dos personagens das histórias. A
escola fará bem em dar vazão a isso promovendo uma ampliação do repertório de
referências. Mas é importante lembrar que os modelos teóricos são sempre
parciais e que, no caso de Piaget em particular, não existem receitas para a
sala de aula.
Para pensar
Os críticos de Piaget costumam
dizer que ele deu importância excessiva aos processos individuais e internos de
aquisição do aprendizado. Os que afirmam isso em geral contrapõem a obra
piagetiana à do pensador bielo-russo Lev Vygotsky (1896-1934). Para ele, como
para Piaget, o aprendizado se dá por interação entre estruturas internas e
contextos externos. A diferença é que, segundo
Vygotsky, esse aprendizado
depende fundamentalmente da influência
ativa do meio social, que Piaget
tendia a considerar apenas uma
“interferência” na construção do
conhecimento. “É preciso lembrar
que Piaget queria abordar o
conhecimento do ponto de vista
de qualquer criança”, diz Lino de
Macedo em defesa do cientista
suíço. Pela sua experiência em
sala de aula, que peso o meio social
tem nos
processos propriamente cognitivos das crianças? Como você pode influir nisso?
PEDAGOGIA
3-
Paulo
Freire
O mais célebre educador
brasileiro, autor da pedagogia do oprimido, defendia como objetivo da escola
ensinar o aluno a 'ler o mundo' para poder transformá-lo
O escritor e educador em janeiro
de 1977
Frases de Paulo Freire:
"Não
é possível pensar em linguagem sem ideologia e sem poder"
"Se
a educação sozinha não transforma a sociedade, sem ela tampouco a sociedade
muda"
Paulo Freire nasceu em 1921 em
Recife, numa família de classe média. Com o agravamento da crise econômica
mundial iniciada em 1929 e a morte de seu pai, quando tinha 13 anos, Freire
passou a enfrentar dificuldades econômicas. Formou-se em direito, mas não
seguiu carreira, encaminhando a vida profissional para o magistério. Suas
idéias pedagógicas se formaram da observação da cultura dos alunos - em
particular o uso da linguagem - e do papel elitista da escola. Em 1963, em
Angicos (RN), chefiou um programa que alfabetizou 300 pessoas em um mês. No ano
seguinte, o golpe militar o surpreendeu em Brasília, onde coordenava o Plano
Nacional de Alfabetização do presidente João Goulart. Freire passou 70 dias na
prisão antes de se exilar. Em 1968, no Chile, escreveu seu livro mais
conhecido, Pedagogia do Oprimido. Também deu aulas nos Estados Unidos e na
Suíça e organizou planos de alfabetização em países africanos. Com a anistia,
em 1979, voltou ao Brasil, integrando-se à vida universitária. Filiou-se ao
Partido dos Trabalhadores e, entre 1989 e 1991, foi secretário municipal de
Educação de São Paulo. Freire foi casado duas vezes e teve cinco filhos. Foi
nomeado doutor honoris causa de 28 universidades em vários países e teve obras
traduzidas em mais de 20 idiomas. Morreu em 1997, de enfarte.
Paulo Freire foi o mais célebre
educador brasileiro, com atuação e reconhecimento internacionais. Conhecido principalmente
pelo método de alfabetização de adultos que leva seu nome, ele desenvolveu um
pensamento pedagógico assumidamente político. Para Freire, o objetivo maior da
educação é conscientizar o aluno. Isso significa, em relação às parcelas
desfavorecidas da sociedade, levá-las a entender sua situação de oprimidas e
agir em favor da própria libertação. O principal livro de Freire se intitula
justamente Pedagogia do Oprimido e os conceitos nele contidos baseiam boa parte
do conjunto de sua obra.
Ao propor uma prática de sala de
aula que pudesse desenvolver a criticidade dos alunos, Freire condenava o
ensino oferecido pela ampla maioria das escolas (isto é, as "escolas
burguesas"), que ele qualificou de educação bancária. Nela, segundo
Freire, o professor age como quem deposita conhecimento num aluno apenas
receptivo, dócil. Em outras palavras, o saber é visto como uma doação dos que
se julgam seus detentores. Trata-se, para Freire, de uma escola alienante, mas
não menos ideologizada do que a que ele propunha para despertar a consciência
dos oprimidos. "Sua tônica fundamentalmente reside em matar nos educandos
a curiosidade, o espírito investigador, a criatividade", escreveu o
educador. Ele dizia que, enquanto a escola conservadora procura acomodar os
alunos ao mundo existente, a educação que defendia tinha a intenção de
inquietá-los.
Seres inacabados
O método Paulo Freire não visa
apenas tornar mais rápido e acessível o aprendizado, mas pretende habilitar o
aluno a "ler o mundo", na expressão famosa do educador.
"Trata-se de aprender a ler a realidade (conhecê-la) para em seguida poder
reescrever essa realidade (transformá-la)", dizia Freire. A alfabetização
é, para o educador, um modo de os desfavorecidos romperem o que chamou de
"cultura do silêncio" e transformar a realidade, "como sujeitos
da própria história".
No conjunto do pensamento de
Paulo Freire encontra-se a idéia de que tudo está em permanente transformação e
interação. Por isso, não há futuro a priori, como ele gostava de repetir no fim
da vida, como crítica aos intelectuais de esquerda que consideravam a
emancipação das classes desfavorecidas como uma inevitabilidade histórica. Esse
ponto de vista implica a concepção do ser humano como "histórico e
inacabado" e conseqüentemente sempre pronto a aprender. No caso particular
dos professores, isso se reflete na necessidade de formação rigorosa e
permanente. Freire dizia, numa frase famosa, que "o mundo não é, o mundo
está sendo".
Três etapas rumo à
conscientização
Embora o trabalho de
alfabetização de adultos desenvolvido por Paulo Freire tenha passado para a
história como um "método", a palavra não é a mais adequada para
definir o trabalho do educador, cuja obra se caracteriza mais por uma reflexão
sobre o significado da educação. "Toda a obra de Paulo Freire é uma
concepção de educação embutida numa concepção de mundo", diz José
Eustáquio Romão. Mesmo assim, distinguem-se na teoria do educador pernambucano
três momentos claros de aprendizagem. O primeiro é aquele em que o educador se
inteira daquilo que o aluno conhece, não apenas para poder avançar no ensino de
conteúdos mas principalmente para trazer a cultura do educando para dentro da
sala de aula. O segundo momento é o de exploração das questões relativas aos
temas em discussão - o que permite que o aluno construa o caminho do senso
comum para uma visão crítica da realidade. Finalmente, volta-se do abstrato
para o concreto, na chamada etapa de problematização: o conteúdo em questão
apresenta-se "dissecado", o que deve sugerir
ações para superar impasses. Para
Paulo Freire, esse procedimento serve ao objetivo final do ensino, que é a
conscientização do aluno.
Para pensar
Um
conceito a que Paulo Freire deu a máxima importância, e que nem sempre é
abordado pelos teóricos, é o de coerência. Para ele, não é possível adotar
diretrizes pedagógicas de modo conseqüente sem que elas orientem a prática, até
em seus aspectos mais corriqueiros. "As qualidades e virtudes são
construídas por nós no esforço que nos impomos para diminuir a distância entre
o que dizemos e fazemos", escreveu o educador. "Como, na verdade,
posso eu continuar falando no respeito à dignidade do educando se o ironizo, se
o discrimino, se o inibo com minha arrogância?" Você, professor, tem a
preocupação de agir na escola de acordo com os princípios em que acredita? E
costuma analisar as próprias atitudes sob esse ponto de vista?
PEDAGOGIA
4-
Ovide
Decroly
Este médico e educador belga
defendia a idéia de que as crianças apreendem o mundo com base em uma visão do
todo
No campo da expressão, Decroly
dedicou muita atenção à questão da linguagem
Frases de Ovide Decroly:
"Convém
que o trabalho das crianças não seja uma simples cópia; é necessário que seja
realmente a expressão de seu pensamento"
"O
meio natural é o verdadeiro material intuitivo capaz de estimular forças
escondidas da criança"
Ovide Decroly nasceu em 1871,em
Renaix, na Bélgica, filho de um industrial e de uma professora de música. Como
estudante, não teve dificuldade de aprendizado, mas, por causa de indisciplina,
foi expulso de várias escolas. Recusava-se a freqüentar as aulas de catecismo.
Mais tarde preconizaria um modelo de ensino não-autoritário e não-religioso.
Formou-se em medicina e estudou neurologia na Bélgica e na Alemanha. Sua
atenção voltou-se desde o início para as crianças deficientes mentais. Esse
interesse o levou a fazer a transição da medicina para a educação. Por essa
época criou uma disciplina, a "pedotecnia", dirigida ao estudo das
atividades pedagógicas coordenadas ao conhecimento da evolução física e mental
das crianças. Casou-se e teve três filhos. Em 1907, fundou a École de l’Ermitage, em Bruxelas, para
crianças consideradas "normais". A escola, que se tornou célebre em
toda a Europa, serviu de espaço de experimentação para o próprio Decroly. A
partir de então, viajou pela Europa e pela América, fazendo contatos com diversos
educadores, entre eles o norte-americano John Dewey (1859-1952). Decroly
escreveu mais de 400 livros, mas nunca sistematizou seu método por escrito, por
julgá-lo em construção permanente. Morreu em 1932, em Uccle, na região de
Bruxelas.
Entre os pensadores da educação
que, na virada do século 19 para o 20, contestaram o modelo de escola que
existia até então e propuseram uma nova concepção de ensino, o belga Ovide
Decroly foi provavelmente o mais combativo. Por ter sido, na infância, um
estudante indisciplinado, que não se adaptava ao autoritarismo da sala de aula
nem do próprio pai, Decroly dedicou-se apaixonadamente a experimentar uma
escola centrada no aluno, e não no professor, e que preparasse as crianças para
viver em sociedade, em vez de simplesmente fornecer a elas conhecimentos
destinados a sua formação profissional.
Decroly foi um dos precursores
dos métodos ativos, fundamentados na possibilidade de o aluno conduzir o
próprio aprendizado e, assim, aprender a aprender. Alguns de seus pensamentos
estão bem vivos nas salas de aula e coincidem com propostas pedagógicas
difundidas atualmente. É o caso da idéia de globalização de conhecimentos - que
inclui o chamado método global de alfabetização - e dos centros de interesse.
O princípio de globalização de
Decroly se baseia na idéia de que as crianças apreendem o mundo com base em uma
visão do todo, que posteriormente pode se organizar em partes, ou seja, que vai
do caos à ordem. O modo mais adequado de aprender a ler, portanto, teria seu
início nas atividades de associação de significados, de discursos completos, e
não do conhecimento isolado de sílabas e letras. "Decroly lança a idéia do
caráter global da vida intelectual, o princípio de que um conhecimento evoca
outro e assim sucessivamente", diz Marisa Del Cioppo Elias, professora da
Faculdade de Educação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
Os centros de interesse são
grupos de aprendizado organizados segundo faixas de idade dos estudantes. Eles
também foram concebidos com base nas etapas da evolução neurológica infantil e
na convicção de que as crianças entram na escola dotadas de condições
biológicas suficientes para procurar e desenvolver os conhecimentos de seu
interesse. "A criança tem espírito de observação; basta não matá-lo",
escreveu Decroly.
Necessidade e interesse
O conceito de interesse é
fundamental no pensamento de Decroly. Segundo ele, a necessidade gera o
interesse e só este leva ao conhecimento. Fortemente influenciado pelas idéias
sobre a natureza intrínseca do ser humano preconizadas por Jean-Jacques
Rousseau (1712-1778), Decroly atribuía às necessidades básicas a eterminação da
vida intelectual. Para ele, as quatro necessidades humanas principais são
comer, abrigar-se, defender- se e produzir.
A trajetória intelectual e
profissional de Decroly se assemelha à da contemporânea Maria Montessori
(1870-1952). Como a italiana, o educador belga se formou em medicina.
Encaminhando- se para a neurologia, também como ela trabalhou com deficientes
mentais, criou métodos baseados na observação e aplicouos à educação de
crianças consideradas "normais". Ambos acreditavam que o ensino
deveria se aproveitar das aptidões naturais de cada faixa etária.
Mas, ao contrário de Montessori,
cujo método previa o atendimento individual na sala de aula, Decroly preferia o
trabalho em grupos, uma vez que a escola, para ele, deveria preparar para o
convívio em sociedade. Outra diferença é que a escola montessoriana recebe as
crianças em ambientes preparados para tornar produtivos os impulsos naturais
dos alunos, enquanto a escola-oficina de Decroly trabalha com elementos reais,
saídos do dia-a-dia.
Os métodos e as atividades
propostos pelo educador têm por objetivo, fundamentalmente, desenvolver três
atributos: a observação, a associação e a expressão. A observação é
compreendida como uma atitude constante no processo educativo. A associação
permite que o conhecimento adquirido pela observação seja entendido em termos
de tempo e de espaço. E a expressão faz com que a criança externe e compartilhe
o que aprendeu.
Linguagens múltiplas
No campo da expressão, Decroly
dedicou cuidadosa atenção à questão da linguagem. Para ele, não só a palavra é
meio de expressão mas também, entre outros, o corpo, o desenho, a construção e
a arte.
Com a ampliação do conceito de linguagem,
que a lingüística viria a corroborar, Decroly pretendia dissociar a idéia de
inteligência da capacidade de dominar a linguagem convencional, valorizando
expressões "concretas" como os trabalhos manuais, os esportes e os
desenhos.
Escolas que são oficinas
A marca principal da escola
decroliana são os centros de interesse, nos quais os alunos escolhem o que
querem aprender. São eles também que constroem o próprio currículo, segundo sua
curiosidade e sem a separação tradicional entre as disciplinas. "Hoje se
fala tanto em interdisciplinaridade e projetos didáticos. Isso nada mais é do
que os centros de interesse", diz a professora Marisa del Cioppo Elias. Os
planos de estudo dos centros de interesse podem surgir, entre as crianças
menores, das questões mais corriqueiras.
A marca principal da escola
decroliana são os centros de interesse, nos quais os alunos escolhem o que
querem aprender. São eles também que constroem o próprio currículo, segundo sua
curiosidade e sem a separação tradicional entre as disciplinas. "Hoje se
fala tanto em interdisciplinaridade e projetos didáticos. Isso nada mais é do
que os centros de interesse", diz a professora Marisa del Cioppo Elias. Os
planos de estudo dos centros de interesse podem surgir, entre as crianças
menores, das questões mais corriqueiras.
Para pensar
Decroly
ficou chocado coma realidade que conheceu ao trabalhar com deficientes - a
maioria recém-saída de uma experiência de marginalização e fracasso nas escolas
públicas. O médico equiparava parte dos institutos de educação dos bairros
pobres a hospícios e casas de correção para delinqüentes. Decroly concebia as
relações dentro da escola como uma sociedade em miniatura. Elas teriam função
preventiva, de garantir formação intelectual, física e moral sólida para construir
uma vida de cidadão. Essa formação deveria ser conduzida pelas próprias
crianças desde os primeiros anos de escola. E você, o que acha? A melhor forma
de a escola se organizar é mesmo por meio dos interesses dos alunos?
PEDAGOGIA
5-
Maria
Montessori
Segundo a visão pedagógica da
pesquisadora italiana, o potencial de aprender está em cada.
Maria Montessori priorizava os anos iniciais de aprendizado.
Frase de Maria Montessori:
"A
tarefa do professor é preparar motivações para atividades culturais, num
ambiente previamente organizado, e depois se abster de interferir"
Maria Montessori nasceu em 1870,
em Chiaravalle, no norte da Itália, filha única de um casal de classe média.
Desde pequena se interessou pelas ciências e decidiu enfrentar a resistência do
pai e de todos à sua volta para estudar medicina na Universidade de Roma.
Direcionou a carreira para a psiquiatria e logo se interessou por crianças com
retardo mental, o que mudaria sua vida e a história da educação. Ela percebeu
que aqueles meninos e meninas proscritos da sociedade por serem considerados
ineducáveis respondiam com rapidez e entusiasmo aos estímulos para realizar
trabalhos domésticos, exercitando as habilidades motoras e experimentando autonomia.
Em pouco tempo, a atividade combinada de observação prática e pesquisa
acadêmica levou a médica a experiências com as crianças ditas normais.
Montessori graduou-se em pedagogia, antropologia e psicologia e pôs suas idéias
em prática na primeira Casa dei Bambini (Casa das crianças), aberta numa região
pobre no centro de Roma. Depois dessa, foram fundadas outras em diversos
lugares da Itália. O sucesso das "casas" tornou Montessori uma
celebridade nacional. Em 1922 o governo a nomeou inspetora-geral das escolas da
Itália. Com a ascensão do regime fascista, porém, ela decidiu deixar o país em
1934. Continuou trabalhando na Espanha, no Ceilão (hoje Sri Lanka), na Índia e
na Holanda, onde morreu aos 81 anos, em 1952.
Poucos nomes da história da
educação são tão difundidos fora dos círculos de especialistas como Montessori.
Ele é associado, com razão, à Educação Infantil, ainda que não sejam muitos os
que conhecem profundamente esse método ou sua fundadora, a italiana Maria
Montessori. Primeira mulher a se formar em medicina em seu país, foi também
pioneira no campo pedagógico ao dar mais ênfase à auto-educação do aluno do que
ao papel do professor como fonte de conhecimento. "Ela acreditava que a
educação é uma conquista da criança, pois percebeu que já nascemos com a
capacidade de ensinar a nós mesmos, se nos forem dadas as condições", diz
Talita de Oliveira Almeida, presidente da Associação Brasileira de Educação
Montessoriana. Individualidade, atividade e liberdade do aluno são as bases da
teoria, com ênfase para o conceito de indivíduo como, simultaneamente, sujeito
e objeto do ensino. Montessori defendia uma concepção de educação que se
estende além dos limites do acúmulo de informações. O objetivo da escola é a
formação integral do jovem, uma "educação para a vida". A filosofia e
os métodos elaborados pela médica italiana procuram desenvolver o potencial
criativo desde a primeira infância, associando-o à vontade de aprender -
conceito que ela considerava inerente a todos os seres humanos.
Ao defender o respeito às
necessidades e aos interesses de cada estudante, de acordo com os estágios de
desenvolvimento correspondentes às faixas etárias, Montessori argumentava que
seu método não contrariava a natureza humana e, por isso, era mais eficiente do
que os tradicionais. Os pequenos conduziriam o próprio aprendizado e ao
professor caberia acompanhar o processo e detectar o modo particular de cada um
manifestar seu potencial.
Por causa dessa perspectiva
desenvolvimentista, Montessori elegeu como prioridade os anos iniciais da vida.
Para ela, a criança não é um pretendente a adulto e, como tal, um ser
incompleto. Desde seu nascimento, já é um ser humano integral, o que inverte o
foco da sala de aula tradicional, centrada no professor. Não foi por acaso que
as escolas que fundou se chamavam Casa dei Bambini (Casa das crianças),
evidenciando a prevalência do aluno. Foi nessas "casas" que ela
explorou duas de suas idéias principais: a educação pelos sentidos e a educação
pelo movimento.
Escola sem lugar marcado
As salas de aula tradicionais
eram vistas com desprezo por Maria Montessori. Ela dizia que pareciam coleções
de borboletas, com cada aluno preso no seu lugar. Quem entra numa sala de aula
de uma escola montessoriana encontra crianças espalhadas, sozinhas ou em
pequenos grupos, concentradas nos exercícios. Os professores estão misturados a
elas, observando ou ajudando. Não existe hora do recreio, porque não se faz a
diferença entre o lazer e a atividade didática. Nessas escolas as aulas não se
sustentam num único livro de texto. Os estudantes aprendem a pesquisar em
bibliotecas (e, hoje, na internet) para preparar apresentações aos colegas.
Atualmente existem escolas montessorianas nos cinco continentes, em geral
agrupadas em associações que trocam informações entre si. Calcula-se em torno
de 100 o número dessas instituições no Brasil.
Para pensar
O
principal legado da italiana Maria Montessori foi afirmar que as crianças
trazem dentro de si o potencial criador que permite que elas mesmas conduzam o
aprendizado e encontrem um lugar no mundo. "Todo conhecimento passa por
uma prática e a escola deve facilitar o acesso a ela", diz a educadora
Talita de Oliveira Almeida. É o que Montessori chamou de "ajude-me a agir
por mim mesmo". Outro aspecto fundamental da teoria montessoriana é
deslocar o enfoque educacional do conteúdo para a forma do pensamento. As
críticas mais comuns ao montessorianismo referem-se ao enfoque individualista e
ao excesso de materiais e procedimentos construídos dentro da escola - o que
dificultaria a adaptação dos alunos a outros sistemas de ensino e ao
"mundo real". Os montessorianos argumentam que, ao contrário, o
método se volta para a vida em comunidade e enfatiza a cooperação. E você? Acha
que dar atenção individual aos alunos é um modo de contrabalançar a tendência
contemporânea à massificação, inclusive do ensino?
PEDAGOGIA
6-
John
Locke
Com a experiência, você ouve,
visualiza, sente, na medida em que você se de confronta com a realidade acaba
adquirindo o conhecimento, nós vamos nos construindo a partir da
experiência, a partir do contato dos
nossos sentidos, da experiência com a realidade, não existe nada na mente
humana sem ter passado pelo sentido.
Pensador inglês via na mente da
criança uma tela em branco que o professor deveria preencher, fornecendo
informações e vivências.
Para Locke, sem educação, a criança está
condenada ao egocentrismo e à ignorância.
Frases de John Locke:
"Os
homens são bons ou maus, úteis ou inúteis, graças a sua educação"
"Um
espírito são em um corpo são é uma descrição breve, porém completa, de um
estado feliz neste mundo"
John Locke nasceu em Wrington, no
sudoeste da Inglaterra, em 1632. Aos 20 anos, entrou para a Universidade de
Oxford, onde orientou os estudos para as ciências naturais e a medicina. Em 1666,
numa visita a Oxford, o lorde Anthony Ashley-Cooper, futuro conde de
Shaftesbury, precisou de cuidados médicos e foi atendido por Locke. No ano
seguinte, ele se tornou conselheiro do lorde para questões de saúde, política e
economia. Por influência de Ashley, Locke ajudou a elaborar a Constituição do
estado norteamericano da Carolina. Depois de uma temporada na França, o
filósofo foi chamado por Ashley a assumir um cargo de conselheiro no governo do
rei Carlos II. Uma reviravolta política afastou ambos do poder. Perseguido,
Locke se refugiou na Holanda. Com a Revolução Gloriosa na Inglaterra, voltou na
comitiva do novo rei, Guilherme de Orange. Em seus últimos anos, viveu no
campo, perto de Oates, e foi mentor intelectual do Partido Liberal. Morreu de causas
naturais em 1704.
A influência do inglês John Locke
costuma ser separada em três grandes áreas. Na política, ele foi o pai do
liberalismo como o conhecemos hoje: é o autor de dois tratados de governo que
sustentaram a implantação da monarquia parlamentarista na Inglaterra,
inspiraram a Constituição dos Estados Unidos e anteciparam as idéias dos
iluministas franceses. Na filosofia, construiu uma teoria do conhecimento
inovadora, que investigou o modo como a mente capta e traduz o mundo exterior.
Na educação, compilou uma série de preceitos sobre aprendizado e
desenvolvimento, com base em sua experiência de médico e preceptor, que teve
grande repercussão nas classes emergentes de seu tempo.
Mas essas três vertentes não são
estanques. A grande e duradoura importância de Locke para a história do
pensamento está no entrecruzamento de suas áreas de estudo. Assim, a defesa da
liberdade individual, que ocupa lugar central na doutrina política lockiana,
encontra correspondência na prioridade que ele confere, no campo da educação,
ao desenvolvimento de um pensamento próprio pela criança.
E suas investigações sobre o
conhecimento o levaram a conceber um aprendizado coerente com sua mais famosa
afirmação: a mente humana é tabula rasa, expressão latina análoga à idéia de
uma tela em branco. "A razão, inicialmente, encontra-se apenas em potência
na criança", diz Clenio Lago, da Universidade do Oeste de Santa Catarina.
Treino para a razão
É por isso que, para Locke, o
aprendizado depende primordialmente das informações e vivências às quais a
criança é submetida e que ela absorve de modo relativamente previsível e
passivo. É, portanto, um aprendizado de fora para dentro, ao contrário do que
defenderam alguns pensadores de linha idealista, como o suíço Jean-Jacques Rousseau
(1712-1778) e Johann Heinrich Pestalozzi (1746-1827), e a maioria dos teóricos
da educação contemporâneos.
"A concepção construtivista,
por exemplo, institui-se com base na relação entre sujeito e objeto, enquanto a
visão lockiana enfatiza apenas o objeto", explica Lago. Embora
considerasse que a origem de todas as idéias estava fora do indivíduo, Locke
via a capacidade de entendimento como inata e variável de pessoa para pessoa.
Os dois fundamentos iniciais de
sua obra mais importante, Ensaio sobre o Entendimento Humano, são a negação da
existência de idéias inatas - o que contrariava o legado do filósofo mais
influente da época, o francês René Descartes (1596-1650) - e o princípio de que
todas as idéias nascem da experiência, refundando, na ciência moderna, o
empirismo. Ao combater o inatismo, Locke se opunha às correntes de pensamento
que encontravam no ser humano a idéia natural de Deus e noções de moral ou
bondade intrínsecas. Tudo isso seria atingido apenas pela razão. Os princípios
morais derivariam de considerações a respeito do que é vantajoso para o
indivíduo e para a coletividade.
A educação ganhava, desse modo,
importância incontornável na formação da criança, uma vez que, sozinha, ela se
encontra desprovida de matéria-prima para o raciocínio e sem orientação para
adquiri-lo, estando fadada ao egocentrismo e à ignorância moral.
Apesar do valor que dava à
racionalidade, Locke era cético quanto ao alcance da compreensão da mente. O
objetivo de sua obra principal foi tentar determinar quais são os mecanismos e
os limites da capacidade de apreensão do mundo pelo homem. Segundo o filósofo,
como todo conhecimento advém, em última instância, dos sentidos, só se pode
captar as coisas e os fenômenos em sua superfície, sendo impossível chegar a
suas causas primordiais. Do material fornecido pelos sentidos nasceriam as
idéias simples que, combinadas, formariam as mais complexas. O conhecimento não
passaria de "concordância ou discordância entre as idéias".
Para Locke, as crianças não são
dotadas de motivação natural para o aprendizado. É necessário oferecer o
conhecimento a elas de modo convidativo - mediante jogos, por exemplo. E,
embora desse primazia teórica às sensações, não via nelas função didática:
educar com prêmios e punições (para provocar prazer e mal-estar) seria manter
os pequenos no estágio mais primário do entendimento humano. Levá-los a pensar
faria com que rompessem a dependência dos sentidos. Embora não descartasse a
possibilidade de castigos, inclusive corporais, Locke afirmava que seu uso
poderia fazer com que as crianças se tornassem adultos frágeis e medrosos.
Guia para a formação do
cavalheiro
No livro Alguns Pensamentos
Referentes à Educação, Locke afirma que "é possível levar, facilmente, a
alma das crianças numa ou noutra direção, como a água". Formar um aluno,
sob o aspecto intelectual ou moral, seria exclusivamente um resultado do
trabalho das pessoas que os educam - pais e professores, a quem caberia sobretudo
dar o exemplo de como pensar e se comportar, treinando a criança para agir
adequadamente. O aprendizado deveria ser feito por meio de atividades. A idéia
era que a criança, pelo hábito, acabaria por entender o que está fazendo. Para
Locke, a educação ideal seria promovida em casa, por um preceptor, papel que
ele próprio desempenhou para os filhos de alguns amigos. "Locke pensou
somente nos homens burgueses, destinados a ser os novos governantes, pois
acreditava que por intermédio do exemplo dado por eles seriam educados os
demais", diz Clenio Lago. A conduta e a ética do gentleman (o cavalheiro
burguês), incluindo as boas maneiras, tinham prioridade sobre a instrução. A
saúde e o controle do corpo também ganharam destaque porque Locke preconizava certo
endurecimento físico para facilitar a autodisciplina e o domínio das paixões.
Para pensar
Locke acreditava que as crianças
vêm ao mundo sem nenhum conhecimento, mas já trazendo inclinações e
principalmente um temperamento. O educador deveria observar as características
emocionais do aluno para submetê-lo a diferentes métodos de aprendizado. Mesmo
que as concepções de conhecimento do filósofo estejam parcialmente
ultrapassadas, essa é uma recomendação que ainda pode ser levada em conta.
PEDAGOGIA
7- Tomás Hobbes
Tomás Hobbes nasceu em Westport, em
1588. Filho de clérigo, Hobbes, em 1608, sai da Universidade de Oxford e se
torna preceptor do filho de Lord Cavendish. Durante toda sua vida, ele será o
amigo devotado dos Stuarts. Antes mesmo da revolução de 1648, que vai suprimir
o poder real, ele foge da Inglaterra, onde se sente ameaçado por causa de suas
convicções monarquistas. Viajará por diversos países da Europa, notadamente
pela Itália (encontrará Galileu em Florença) e sobretudo pela França
(encontrará o padre Mersenne em Paris). Retornará à Inglaterra por ocasião da
restauração de Carlos II em 1660.
Em 1642, ele publica em Paris o De
Cive e, em 1651, faz publicar em Londres o Leviatã ou matéria, forma e
autoridade de uma comunidade eclesiástica e civil. O Leviatã será traduzido
para o latim em 1688, em Amsterdam, mas nunca foi integralmente traduzido para
o francês.
Hobbes é um empirista inglês e nele
encontramos os temas fundamentais que serão sempre os da escola. A origem de
todo conhecimento é a sensação, princípio original do conhecimento dos próprios
princípios: a imaginação é um agrupamento inédito de fragmentos de sensação e a
memória nada mais é do que o reflexo de antigas sensações.
Todavia, Hobbes crê na possibilidade
de uma lógica pura, de um raciocínio demonstrativo muito rigoroso. Ao lado de
uma indução empírica aproximativa, que da experiência passada conclui, sem
prova decisiva, o que se passará amanhã (e que não tem outro fundamento além da
associação de idéias, the trayan of imagination), Hobbes admite a existência de
uma lógica pura, perfeitamente racional. Mas a essa lógica só concernem
símbolos, palavras (Hobbes é nominalista). Se definirmos rigorosamente as
palavras e as regras do emprego dos signos, podemos chegar a conclusões
rigorosas, isto é, idênticas aos princípios de que partimos. Mas trata-se de um
jogo do pensamento, estranho às realidades concretas.
A filosofia de Hobbes é materialista e
mecanicista. Assim como a percepção é explicada mecanicamente a partir das
excitações transmitidas pelo cérebro, assim a moral se reduz ao interesse e à
paixão. Na fonte de todos os nossos valores, há o que Hobbes denomina
endeavour, em inglês, e conatus, em latim, isto é, o instinto de conservação
ou, mais exatamente, de afirmação e de crescimento de si próprio; esforço
próprio a todos os seres para unir-se ao que lhes agrada e fugir do que lhes
desagrada (esse tema do conatus será reencontrado no spinozismo).
É partindo de tais fundamentos
psicológicos que Hobbes elabora sua justificação do despotismo. O absolutismo
da época de Hobbes geralmente se apóia na teologia (Deus teria investido os
reis de seu poder absoluto). Hobbes, ao justificar o poder absoluto do
soberano, descobre-lhe uma origem natural.
Para ele, o direito, em todos os
casos, reduz-se à força; mas distingue dois momentos na história da humanidade:
o estado natural e o estado político. No estado natural, o poder de cada um é
medido por seu poder real; cada um tem exatamente tanto de direito quanto de
força e todos só pensam na própria conservação e nos interesses pessoais. Para
Hobbes, o homem se distingue dos insetos sociais, como as abelhas e as
formigas; por isso, o homem não possui instinto social. Ele não é sociável por
natureza e só o será por acidente.
Para compreender como o homem se
resolve a criar a instituição artificial do governo, basta descrever o que se
passa no estado natural; o homem, por natureza, procura ultrapassar todos os
seus semelhantes: ele não busca apenas a satisfação de suas necessidades
naturais, mas sobretudo as alegrias da vaidade (pride). O maior sofrimento é
ser desprezado. Assim sendo, o ofendido procura vingar-se, mas - observa
Hobbes, antecipando aqui os temas hegelianos - comumente não deseja a morte de
seu adversário e deseja seu cativeiro a fim de poder ler, em seu olhar
atemorizado e submisso, o reconhecimento de sua própria superioridade.
É claro que esse estado, em que cada
um procura senão a morte, ao menos a sujeição do outro, é um estado
extremamente infeliz. As expressões pelas quais Hobbes o descreve são célebres:
"Homo homini lupus", o homem é o lobo do homem; "Bellum omnium
contra omnes", é a guerra de todos contra todos. Não pensemos que mesmo os
homens mais robustos desfrutem tranqüilamente as vitórias que sua força lhe
assegura. Aquele que possui grande força muscular não está ao abrigo da astúcia
do mais fraco. Este último - por maquinação secreta ou a partir de hábeis
alianças - sempre é o suficientemente forte para vencer o mais forte. Por
conseguinte, ao invés de uma desigualdade, é uma espécie de igualdade dos
homens no estado natural que faz sua infelicidade. Pois, em definitivo, ninguém
está protegido; o estado natural é, para todos, um estado de insegurança e de
angústia.
Assim sendo, o homem sempre tem medo
de ser morto ou escravizado e esse temor, em última instância mais poderoso do
que o orgulho, é a paixão que vai dar a palavra à razão. (Essa psicologia da
vaidade e do medo é, em Hobbes, uma espécie de laicização da oposição teológica
entre o orgulho espiritual e o temor a Deus ou humildade.) É o medo, portanto,
que vai obrigar os homens a fundarem um estado social e a autoridade política.
Os homens, portanto, vão se encarregar
de estabelecer a paz e a segurança. Só haverá paz concretizável se cada um
renunciar ao direito absoluto que tem sobre todas as coisas. Isto só será
possível se cada um abdicar de seus direitos absolutos em favor de um soberano
que, ao herdar os direitos de todos, terá um poder absoluto. Não existe aí a
intervenção de uma exigência moral. Simplesmente o medo é maior do que a
vaidade e os homens concordam em transmitir todos os seus poderes a um
soberano. Quanto a este último, notemo-lo bem, ele é o senhor absoluto desde
então, mas não possui o menor compromisso em relação a seus súditos.
Seu direito não tem outro limite que
seu poder e sua vontade. No estado de sociedade, como no de natureza, a força é
a única medida do direito. No estado social, o monopólio da força pertence ao
soberano. Houve, da parte de cada indivíduo, uma atemorizada renúncia do seu
próprio poder. Mas não houve pacto nem contrato, o que houve, como diz
Halbwachs, foi "uma alienação e não uma delegação de poderes". O
efeito comum do poder consistirá, para todos, na segurança, uma vez que o
soberano terá, de fato, o maior interesse em fazer reinar a ordem se quiser
permanecer no poder. Apesar de tudo, esse poder absoluto permanece um poder de
fato que encontrará seus limites no dia em que os súditos preferirem morrer do
que obedecer. Em todo caso, esta á a origem psicológica que Hobbes atribui ao
poder despótico. Ele chama de Leviatã ao seu estado totalitário em lembrança de
uma passagem da Bíblia (Jó XLI) em que tal palavra designa um animal
monstruoso, cruel e invencível que é o rei dos orgulhosos.
Finalmente, o totalitarismo de Hobbes
submete - apesar de prudentes reservas - o poder religioso ao poder político.
Assim é que ele exclui o "papismo" e o "presbiterianismo"
por causa "dessa autoridade que alguns concedem ao papa em reinos que não
lhe pertencem ou que alguns bispos, em suas dioceses, querem usurpar".
O Estado Natural e o Pacto Social
Leviatã, 1.ª parte: Do Homem
Cap. XIII
... O Estado de natureza, essa guerra
de todos contra todos tem por conseqüência o fato de nada ser injusto. As
noções de certo e errado, de justiça e de injustiça não têm lugar nessa
situação. Onde não há Poder comum, não há lei; onde não há lei, não há
injustiça: força e astúcia são virtudes cardeais na guerra. Justiça e injustiça
não pertencem à lista das faculdades naturais do Espírito ou do Corpo; pois,
nesse caso, elas poderiam ser encontradas num homem que estivesse sozinho no
mundo (como acontece com seus sentidos ou suas paixões). Na realidade, justiça
e injustiça são qualidades relativas aos homens em sociedade, não ao homem
solitário. A mesma situação de guerra não implica na existência da
propriedade... nem na distinção entre o Meu e o Teu, mas apenas no fato de que
a cada um pertence aquilo que for capaz de o guardar. Eis então, e por muito
tempo, a triste condição em que o homem é colocado pela natureza com a
possibilidade, é bem verdade, de sair dela, possibilidade que, por um lado, se
apóia na Paixões e, por outro, em sua Razão. As paixões que inclinam o homem
para a paz são o temor à morte violenta e o desejo de tudo o que é necessário a
uma vida confortável... E a Razão sugere artigos de paz convenientes sobre os
quais os homens podem ser levados a concordar.
Cap. XIV
... O direito natural que os
escritores comumente chamam de Jus naturale é a Liberdade que tem cada um de se
servir da própria força segundo sua vontade, para salvaguardar sua própria
natureza, isto é, sua própria vida. E porque a condição humana é uma condição
de guerra de cada um contra cada um... daí resulta que, nessa situação, cada um
tem direito sobre todas as coisas, mesmo até o corpo dos outros... Enquanto
dura esse direito natural de cada um sobre tudo e todos, não pode existir para
nenhum homem (por mais forte ou astucioso que seja) a menor segurança...
Cap. XV
... Antes que se possa utilizar das
palavras justo e injusto, é preciso que haja um Poder constrangedor;
inicialmente, para forçar os homens a executar seus pactos pelo temor de uma punição
maior do que o benefício que poderiam esperar se os violassem, em seguida, para
garantir-lhes a propriedade do que adquirem por Contrato mútuo em substituição
e no lugar do Direito universal que perdem. E não existe tal poder
constrangedor antes da instituição de um Estado. É o que também resulta da
definição que as Escolas dão geralmente da justiça, a saber, que a justiça é a
vontade de atribuir a cada um o que lhe cabe pertencer; pois, quando nada é
próprio, ou seja, quando não há propriedade, não há injustiça; e onde não há
Poder Constrangedor estabelecido, em outras palavras, onde não há Estado, não
há Propriedade e cada homem tem direito a todas as coisas. Por conseguinte,
enquanto não há Estado, nada há que seja Injusto.
PEDAGOGIA
8- John Dewey
O filósofo norte-americano
defendia a democracia e a liberdade de pensamento como instrumentos para a
manutenção emocional e intelectual das crianças
Dewey é o nome mais célebre da corrente
filosófica que ficou conhecida como pragmatismo
Frases de John Dewey:
"O
professor que desperta entusiasmo em seus alunos conseguiu algo que nenhuma
soma de métodos sistematizados, por mais corretos que sejam, pode obter"
"A
meta da vida não é a perfeição, mas o eterno processo de aperfeiçoamento,
amadurecimento, refinamento"
John Dewey nasceu em 1859 em
Burlington, uma pequena cidade agrícola do estado norte-americano de Vermont.
Na escola, teve uma educação desinteressante e desestimulante, o que foi
compensado pela formação que recebeu em casa. Ainda criança, via sua mãe
confiar aos filhos pequenas tarefas para despertar o senso de responsabilidade.
Foi professor secundário por três anos antes de cursar a Universidade Johns
Hopkins, em Baltimore. Estudou artes e filosofia e tornou-se professor da
Universidade de Minnesota. Escreveu sobre filosofia e Educação, além de arte,
religião, moral, teoria do conhecimento, psicologia e política. Seu interesse
por pedagogia nasceu da observação de que a escola de seu tempo continuava, em
grande parte, orientada por valores tradicionais, e não havia incorporado as
descobertas da psicologia, nem acompanhara os avanços políticos e sociais. Fiel
à causa democrática, ele participou de vários movimentos sociais. Criou uma
universidade-exílio para acolher estudantes perseguidos em países de regime
totalitário. Morreu em 1952, aos 93 anos.
Quantas vezes você já ouviu falar
na necessidade de valorizar a capacidade de pensar dos alunos? De prepará-los
para questionar a realidade? De unir teoria e prática? De problematizar? Se
você se preocupa com essas questões, já esbarrou, mesmo sem saber, em algumas
das concepções de John Dewey, filósofo norte-americano que influenciou
educadores de várias partes do mundo. No Brasil inspirou o movimento da Escola
Nova, liderado por Anísio Teixeira, ao colocar a atividade prática e a
democracia como importantes ingredientes da educação.
Dewey é o nome mais célebre da
corrente filosófica que ficou conhecida como pragmatismo, embora ele preferisse
o nome instrumentalismo - uma vez que, para essa escola de pensamento, as
idéias só têm importância desde que sirvam de instrumento para a resolução de
problemas reais. No campo específico da pedagogia, a teoria de Dewey se
inscreve na chamada educação progressiva. Um de seus principais objetivos é
educar a criança como um todo. O que importa é o crescimento - físico,
emocional e intelectual.
O princípio é que os alunos
aprendem melhor realizando tarefas associadas aos conteúdos ensinados.
Atividades manuais e criativas ganharam destaque no currículo e as crianças
passaram a ser estimuladas a experimentar e pensar por si mesmas. Nesse
contexto, a democracia ganha peso, por ser a ordem política que permite o maior
desenvolvimento dos indivíduos, no papel de decidir em conjunto o destino do
grupo a que pertencem. Dewey defendia a democracia não só no campo
institucional mas também no interior das escolas.
Estímulo à cooperação
Influenciado pelo empirismo,
Dewey criou uma escola-laboratório ligada à universidade onde lecionava para
testar métodos pedagógicos. Ele insistia na necessidade de estreitar a relação
entre teoria e prática, pois acreditava que as hipóteses teóricas só têm
sentido no dia-a-dia. Outro ponto-chave de sua teoria é a crença de que o
conhecimento é construído de consensos, que por sua vez resultam de discussões
coletivas. "O aprendizado se dá quando compartilhamos experiências, e isso
só é possível num ambiente democrático, onde não haja barreiras ao intercâmbio
de pensamento", escreveu. Por isso, a escola deve proporcionar práticas
conjuntas e promover situações de cooperação, em vez de lidar com as crianças
de forma isolada.
Seu grande mérito foi ter sido um
dos primeiros a chamar a atenção para a capacidade de pensar dos alunos. Dewey
acreditava que, para o sucesso do processo educativo, bastava um grupo de
pessoas se comunicando e trocando idéias, sentimentos e experiências sobre as
situações práticas do dia-a-dia. Ao mesmo tempo, reconhecia que, à medida que
as sociedades foram ficando complexas, a distância entre adultos e crianças se
ampliou demais. Daí a necessidade da escola, um espaço onde as pessoas se
encontram para educar e ser educadas. O papel dessa instituição, segundo ele, é
reproduzir a comunidade em miniatura, apresentar o mundo de um modo
simplificado e organizado e, aos poucos, conduzir as crianças ao sentido e à
compreensão das coisas mais complexas. Em outras palavras, o objetivo da escola
deveria ser ensinar a criança a viver no mundo.
"Afinal, as crianças não
estão, num dado momento, sendo preparadas para a vida e, em outro,
vivendo", ensinou, argumentando que o aprendizado se dá justamente quando
os alunos são colocados diante de problemas reais. A Educação, na visão
deweyana, é "uma constante reconstrução da experiência, de forma a dar-lhe
cada vez mais sentido e a habilitar as novas gerações a responder aos desafios
da sociedade". Educar, portanto, é mais do que reproduzir conhecimentos. É
incentivar o desejo de desenvolvimento contínuo, preparar pessoas para
transformar algo.
A experiência educativa é, para
Dewey, reflexiva, resultando em novos conhecimentos. Deve seguir alguns pontos
essenciais: que o aluno esteja numa verdadeira situação de experimentação, que
a atividade o interesse, que haja um problema a resolver, que ele possua os
conhecimentos para agir diante da situação e que tenha a chance de testar suas
idéias. Reflexão e ação devem estar ligadas, são parte de um todo indivisível.
Dewey acreditava que só a inteligência dá ao homem a capacidade de modificar o
ambiente a seu redor.
Liberdade intelectual para os
alunos
A filosofia deweyana remete a uma
prática docente baseada na liberdade do aluno para elaborar as próprias
certezas, os próprios conhecimentos, as próprias regras morais. Isso não
significa reduzir a importância do currículo ou dos saberes do educador. Para
Dewey, o professor deve apresentar os conteúdos escolares na forma de questões
ou problemas e jamais dar de antemão respostas ou soluções prontas. Em lugar de
começar com definições ou conceitos já elaborados, deve usar procedimentos que
façam o aluno raciocinar e elaborar os próprios conceitos para depois
confrontar com o conhecimento sistematizado. Pode-se afirmar que as teorias
mais modernas da didática, como o construtivismo e as bases teóricas dos
Parâmetros Curriculares Nacionais, têm inspiração nas idéias do educador.
Para pensar
Uma das
principais lições deixadas por John Dewey é a de que, não havendo separação
entre vida e educação, esta deve preparar para a vida, promovendo seu constante
desenvolvimento. Como ele dizia, "as crianças não estão, num dado momento,
sendo preparadas para a vida e, em outro, vivendo". Então, qual é a diferença
entre preparar para a vida e para passar de ano? Como educar alunos que têm
realidades tão diferentes entre si e que, provavelmente, terão também futuros
tão distintos?
PEDAGOGIA
9- Johann Heinrich Pestalozzi
Para o educador suíço, os
sentimentos tinham o poder de despertar o processo de aprendizagem autônoma na
criança
Nenhum dos pensadores modernos deu tanta
importância ao amor na Educação quanto Pestalozzi
Frases de Johann Heinrich Pestalozzi:
"As
faculdades do homem têm de ser desenvolvidas de tal forma que nenhuma delas
predomine sobre as outras"
"A
natureza melhor da criança deve ser encorajada o mais cedo possível a combater
a força prepotente do instinto animal"
Johann Heinrich Pestalozzi nasceu
em 1746 em Zurique, na Suíça. Na juventude, ele abandonou os estudos religiosos
para se dedicar à agricultura. Quando a empreitada se tornou o primeiro de
muitos fracassos materiais de sua vida, Pestalozzi levou algumas crianças
pobres para casa, onde encontraram escola e trabalho como tecelãs, aprendendo a
se sustentar. Alguns anos depois, a escola se inviabilizou e Pestalozzi passou
a explorar suas idéias em livros, entre eles Os Crepúsculos de um Eremita e o
romance Leonardo e Gertrudes. Uma nova chance de exercitar seu método só surgiu
quando ele já tinha mais de 50 anos, ao ser chamado para dar aulas aos órfãos
da batalha de Stans. Mais duas experiências se seguiram, em escolas de Burgdorf
e Yverdon. Nesta última, que existiu de 1805 a 1825, Pestalozzi desenvolveu seu
projeto mais abrangente, dando aulas para estudantes de várias origens e
comandando uma equipe de professores. Divergências entre eles levaram a escola
a fechar. Yverdon projetou o nome de Pestalozzi no exterior e foi visitada por
muitos dos grandes educadores da época.
Para a mentalidade contemporânea,
amor talvez não seja a primeira palavra que venha à cabeça quando se fala em
ciência, método ou teoria. Mas o afeto teve papel central na obra de pensadores
que lançaram os fundamentos da pedagogia moderna. Nenhum deles deu mais importância
ao amor, em particular ao amor materno, do que o suíço Johann Heinrich
Pestalozzi (1746-1827).
Antecipando concepções do
movimento da Escola Nova, que só surgiria na virada do século 19 para o 20,
Pestalozzi afirmava que a função principal do ensino é levar as crianças a
desenvolver suas habilidades naturais e inatas. "Segundo ele, o amor
deflagra o processo de auto-educação", diz a escritora Dora Incontri, uma
das poucas estudiosas de Pestalozzi no Brasil.
A escola idealizada por
Pestalozzi deveria ser não só uma extensão do lar como inspirar-se no ambiente
familiar, para oferecer uma atmosfera de segurança e afeto. Ao contrário de
muitos de seus contemporâneos, o pensador suíço não concordava totalmente com o
elogio da razão humana. Para ele, só o amor tinha força salvadora, capaz de
levar o homem à plena realização moral - isto é, encontrar conscientemente,
dentro de si, a essência divina que lhe dá liberdade. "Pestalozzi chega ao
ponto de afirmar que a religiosidade humana nasce da relação afetiva da criança
com a mãe, por meio da sensação de providência", diz Dora Incontri.
Inspiração na natureza
A vida e obra de Pestalozzi estão
intimamente ligadas à religião. Cristão devoto e seguidor do protestantismo,
ele se preparou para o sacerdócio, mas abandonou a idéia em favor da
necessidade de viver junto da natureza e de experimentar suas idéias a respeito
da educação. Seu pensamento permaneceu impregnado da crença na manifestação da
divindade no ser humano e na caridade, que ele praticou principalmente em favor
dos pobres.
A criança, na visão de
Pestalozzi, se desenvolve de dentro para fora - idéia oposta à concepção de que
a função do ensino é preenchê-la de informação. Para o pensador suíço, um dos
cuidados principais do professor deveria ser respeitar os estágios de
desenvolvimento pelos quais a criança passa. Dar atenção à sua evolução, às
suas aptidões e necessidades, de acordo com as diferentes idades, era, para
Pestalozzi, parte de uma missão maior do educador, a de saber ler e imitar a
natureza - em que o método pedagógico deveria se inspirar.
Bondade potencial
Tanto a defesa de uma volta à
natureza quanto a construção de novos conceitos de criança, família e instrução
a que Pestalozzi se dedicou devem muito a sua leitura do filósofo franco-suíço
Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), nome central do pensamento iluminista. Ambos
consideravam o ser humano de seu tempo excessivamente cerceado por convenções
sociais e influências do meio, distanciado de sua índole original - que seria
essencialmente boa para Rousseau e potencialmente fértil, mas egoísta e
submissa aos sentidos, para Pestalozzi.
"A criança, na concepção de
Pestalozzi, era um ser puro, bom em sua essência e possuidor de uma natureza
divina que deveria ser cultivada e descoberta para atingir a plenitude",
diz Alessandra Arce, professora da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da
Universidade de São Paulo, em Ribeirão Preto. O pensador suíço costumava
comparar o ofício do professor ao do jardineiro, que devia providenciar as
melhores condições externas para que as plantas seguissem seu desenvolvimento
natural. Ele gostava de lembrar que a semente traz em si o "projeto"
da árvore toda.
Desse modo, o aprendizado seria,
em grande parte, conduzido pelo próprio aluno, com base na experimentação
prática e na vivência intelectual, sensorial e emocional do conhecimento. É a
idéia do "aprender fazendo", amplamente incorporada pela maioria das
escolas pedagógicas posteriores a Pestalozzi. O método deveria partir do
conhecido para o novo e do concreto para o abstrato, com ênfase na ação e na
percepção dos objetos, mais do que nas palavras. O que importava não era tanto
o conteúdo, mas o desenvolvimento das habilidades e dos valores.
Sem notas, castigos ou prêmios
Ao contrário de Rousseau, cuja
teoria é idealizada, Pestalozzi, segundo a educadora Dora Incontri,
"experimentava sua teoria e tirava a teoria da prática", nas várias
escolas que criou. Pestalozzi aplicou em classe seu princípio da educação
integral - isto é, não limitada à absorção de informações. Segundo ele, o
processo educativo deveria englobar três dimensões humanas, identificadas com a
cabeça, a mão e o coração. O objetivo final do aprendizado deveria ser uma
formação também tripla: intelectual, física e moral. E o método de estudo
deveria reduzir-se a seus três elementos mais simples: som, forma e número. Só
depois da percepção viria a linguagem. Com os instrumentos adquiridos desse
modo, o estudante teria condições de encontrar em si mesmo liberdade e
autonomia moral. Como alcançar esse objetivo dependia de uma trajetória íntima,
Pestalozzi não acreditava em julgamento externo. Por isso, em suas escolas não
havia notas ou provas, castigos ou recompensas, numa época em que chicotear os
alunos era comum. "A disciplina exterior, na escola de Pestalozzi, era
substituída pelo cultivo da disciplina interior, essencial à moral protestante",
diz Alessandra Arce.
Para pensar
A
pesquisadora Dora Incontri vê na obra dos filósofos da educação anteriores ao
século 19 uma concepção do ser humano "mais integral" do que a que
passou a prevalecer então. Segundo Dora, naquela época a ciência, incluindo a
pedagogia, se tornou materialista. "Pensadores como Pestalozzi levavam em
conta aspectos hoje negligenciados, como o espiritual." Ela lamenta a
ausência dessa dimensão. No seu dia-a-dia na escola ou em seus estudos sobre
educação, você já sentiu a sensação de que falta algo à teoria pedagógica?
Chegou a pensar que carência é essa? De que forma ela se reflete na prática?
PEDAGOGIA
10- Henri Wallon
Militante apaixonado, o médico,
psicólogo e filósofo francês mostrou que as crianças têm também corpo e emoções
(e não apenas cabeça) na sala de aula.
Wallon levou não só o corpo da criança mas
também suas emoções para dentro da sala de aula.
Frases de Henri Wallon:
“A
criança responde às impressões que as coisas lhe causam com gestos dirigidos a
elas”
“O
indivíduo é social não como resultado de circunstâncias externas, mas em
virtude de uma necessidade interna”
Henri Paul Hyacinthe Wallon
nasceu em Paris, França, em 1879. Graduou-se em medicina e psicologia. Fez
também filosofia. Atuou como médico na Primeira Guerra Mundial (1914-1918),
ajudando a cuidar de pessoas com distúrbios psiquiátricos. Em 1925, criou um
laboratório de psicologia biológica da criança. Quatro anos mais tarde,
tornou-se professor da Universidade Sorbonne e vice-presidente do Grupo Francês
de Educação Nova – instituição que ajudou a revolucionar o sistema de ensino
daquele país e da qual foi presidente de 1946 até morrer, também em Paris, em
1962. Ao longo de toda a vida, dedicou-se a conhecer a infância e os caminhos
da inteligência nas crianças.
Militante de esquerda, participou
das forças de resistência contra
Adolf Hitler e foi perseguido
pela Gestapo (a polícia política nazista) durante a Segunda Guerra (1939-1945).
Em 1947, propôs mudanças estruturais no sistema educacional francês. Coordenou
o projeto Reforma do Ensino, conhecido como Langevin-Wallon – conjunto de
propostas equivalente à nossa Lei de Diretrizes e Bases. Nele, por exemplo,
está escrito que nenhum aluno deve ser reprovado numa avaliação escolar. Em
1948, lançou a revista Enfance, que serviria de plataforma de novas idéias no
mundo da educação – e que rapidamente se transformou numa espécie de bíblia
para pesquisadores e professores.
Falar que a escola deve
proporcionar formação integral (intelectual, afetiva e social) às crianças é
comum hoje em dia. No início do século passado, porém, essa idéia foi uma
verdadeira revolução no ensino. Uma revolução comandada por um médico,
psicólogo e filósofo francês chamado Henri Wallon. Sua teoria pedagógica, que
diz que o desenvolvimento intelectual envolve muito mais do que um simples
cérebro, abalou as convicções numa época em que memória e erudição eram o
máximo em termos de construção do conhecimento.
Wallon foi o primeiro a levar não
só o corpo da criança mas também suas emoções para dentro da sala de aula.
Fundamentou suas idéias em quatro elementos básicos que se comunicam o tempo
todo: a afetividade, o movimento, a inteligência e a formação do eu como
pessoa. Militante apaixonado (tanto na política como na educação), dizia que
reprovar é sinônimo de expulsar, negar, excluir. Ou seja, “a própria negação do
ensino”.
As emoções, para Wallon, têm
papel preponderante no desenvolvimento da pessoa. É por meio delas que o aluno
exterioriza seus desejos e suas vontades. Em geral são manifestações que
expressam um universo importante e perceptível, mas pouco estimulado pelos
modelos tradicionais de ensino.
Afetividade
As transformações fisiológicas em
uma criança (ou, nas palavras de Wallon, em seu sistema neurovegetativo)
revelam traços importantes de caráter e personalidade. “A emoção é altamente
orgânica, altera a respiração, os batimentos cardíacos e até o tônus muscular,
tem momentos de tensão e distensão que ajudam o ser humano a se conhecer”, explica
Heloysa Dantas, da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP),
estudiosa da obra de Wallon há 20 anos. Segundo ela, a raiva, a alegria, o
medo, a tristeza e os sentimentos mais profundos ganham função relevante na
relação da criança com o meio. “A emoção causa impacto no outro e tende a se
propagar no meio social”, completa a pedagoga Izabel Galvão, também da USP. Ela
diz que a afetividade é um dos principais elementos do desenvolvimento humano.
Movimento
Segundo a teoria de Wallon, as emoções
dependem fundamentalmente da organização dos espaços para se manifestarem. A
motricidade, portanto, tem caráter pedagógico tanto pela qualidade do gesto e
do movimento quanto por sua representação. Por que, então, a disposição do
espaço não pode ser diferente? Não é o caso de quebrar a rigidez e a
imobilidade adaptando a sala de aula para que as crianças possam se movimentar
mais? Mais que isso, que tipo de material é disponibilizado para os alunos numa
atividade lúdica ou pedagógica? Conforme as idéias de Wallon, a escola
infelizmente insiste em imobilizar a criança numa carteira, limitando
justamente a fluidez das emoções e do pensamento, tão necessária para o
desenvolvimento completo da pessoa.
Estudos realizados por Wallon com
crianças entre 6 e 9 anos mostram que o desenvolvimento da inteligência depende
essencialmente de como cada uma faz as diferenciações com a realidade exterior.
Primeiro porque, ao mesmo tempo, suas idéias são lineares e se misturam –
ocasionando um conflito permanente entre dois mundos, o interior, povoado de
sonhos e fantasias, e o real, cheio de símbolos, códigos e valores sociais e
culturais.
Nesse conflito entre situações
antagônicas ganha sempre a criança. É na solução dos confrontos que a
inteligência evolui. Wallon diz que o sincretismo (mistura de idéias num mesmo
plano), bastante comum nessa fase, é fator determinante para o desenvolvimento
intelectual. Daí se estabelece um ciclo constante de boas e novas descobertas.
O eu e o outro
A construção do eu na teoria de
Wallon depende essencialmente do outro. Seja para ser referência, seja para ser
negado. Principalmente a partir do instante em que a criança começa a viver a
chamada crise de oposição, em que a negação do outro funciona como uma espécie
de instrumento de descoberta de si própria. Isso se dá aos 3 anos de idade, a
hora de saber que “eu” sou. “Manipulação (agredir ou se jogar no chão para
alcançar o objetivo), sedução (fazer chantagem emocional com pais e
professores) e imitação do outro são características comuns nessa fase”, diz a
professora Angela Bretas, da Escola de Educação Física da Universidade Estadual
do Rio de Janeiro. “Até mesmo a dor, o ódio e o sofrimento são elementos
estimuladores da construção do eu”, emenda Heloysa Dantas. Isso justifica o espírito
crítico da teoria walloniana aos modelos convencionais de educação.
Wallon na escola: humanizar a
inteligência
Diferentemente dos métodos
tradicionais (que priorizam a inteligência e o desempenho em sala de aula), a
proposta walloniana põe o desenvolvimento intelectual dentro de uma cultura
mais humanizada. A abordagem é sempre a de considerar a pessoa como um todo.
Elementos como afetividade, emoções, movimento e espaço físico se encontram num
mesmo plano. As atividades pedagógicas e os objetos, assim, devem ser
trabalhados de formas variadas. Numa sala de leitura, por exemplo, a criança
pode ficar sentada, deitada ou fazendo coreografias da história contada pelo
professor. Os temas e as disciplinas não se restringem a trabalhar o conteúdo,
mas a ajudar a descobrir o eu no outro. Essa relação dialética ajuda a
desenvolver a criança em sintonia com o meio.
Para pensar
A teoria
de Henri Wallon ainda é um desafio para muitos pais, escolas e professores. Sua
obra faz uma resistência contumaz aos métodos pedagógicos tradicionais. Numa
época de crises, guerras, separações e individualismos como a nossa, não seria
melhor começar a pôr em prática nas escolas idéias mais humanistas, que
valorizem desde cedo a importância das emoções?
PEDAGOGIA
11- Friedrich Froebel
O criador dos jardins-de-infância
defendia um ensino sem obrigações porque o aprendizado depende dos interesses
de cada um e se faz por meio da prática.
As técnicas utilizadas até hoje na Educação
Infantil devem muito a Froebel.
Frase de Friedrich Froebel:
“Por meio
da educação, a criança vai se reconhecer como membro vivo do todo”
Filho de um pastor protestante,
Friedrich Froebel nasceu em Oberweissbach, no sudeste da Alemanha, em 1782.
Nove meses depois de seu nascimento, sua mãe morreu. Adotado por um tio, viveu
uma infância solitária, em que se empenhou em aprender matemática e linguagem e
a explorar as florestas perto de onde morava. Após cursar informalmente algumas
matérias na Universidade de Jena, tornou-se professor e ainda jovem fez uma visita
à escola do pedagogo Johann Heinrich Pestalozzi (1746-1827), em Yverdon, na
Suíça. Em 1811, foi convocado a lutar nas guerras napoleônicas. Fundou sua
primeira escola em 1816, na cidade alemã de Griesheim. Dois anos depois, a
escola foi transferida para Keilhau, onde Froebel pôs em prática suas teorias
pedagógicas. Em 1826, publicou seu livro mais importante, A Educação do Homem.
Em seguida, foi morar na
Suíça, onde treinou professores e
dirigiu um orfanato. Todas essas experiências serviram de inspiração para que
ele fundasse o primeiro jardim-de-infância, na cidade alemã de Blankenburg.
Paralelamente, administrou uma gráfica que imprimiu instruções de brincadeiras
e canções para serem aplicadas em escolas e em casa. Em 1851, confundindo
Froebel com um sobrinho esquerdista, o governo da Prússia proibiu as atividades
dos jardins-de-infância. O educador morreu no ano seguinte, mas o banimento só
foi suspenso em 1860, oito anos mais tarde. Os jardins-de-infância rapidamente
se espalharam pela Europa e nos Estados Unidos, onde foram incorporados aos
preceitos educacionais do filósofo John Dewey (1859-1952).
O alemão Friedrich Froebel foi um
dos primeiros educadores a considerar o início da infância como uma fase de
importância decisiva na formação das pessoas – idéia hoje consagrada pela
psicologia, ciência da qual foi precursor. Froebel viveu em uma época de
mudança de concepções sobre as crianças e esteve à frente desse processo na
área pedagógica, como fundador dos jardins-de-infância, destinado aos menores
de 8 anos. O nome reflete um princípio que Froebel compartilhava com outros
pensadores de seu tempo: o de que a criança é como uma planta em sua fase de
formação, exigindo cuidados periódicos para que cresça de maneira saudável.
“Ele procurava na infância o elo que igualaria todos os homens, sua essência
boa e divina ainda não corrompida pelo convívio social”, diz Alessandra Arce,
professora da Universidade Federal de São Carlos.
As técnicas utilizadas até hoje
em Educação Infantil devem muito a Froebel. Para ele, as brincadeiras são o
primeiro recurso no caminho da aprendizagem. Não são apenas diversão, mas um
modo de criar representações do mundo concreto com a finalidade de entendê-lo.
Com base na observação das atividades dos pequenos com jogos e brinquedos,
Froebel foi um dos primeiros pedagogos a falar em auto-educação, um conceito
que só se difundiria no início do século 20, graças ao movimento da Escola
Nova, de Maria Montessori (1870-1952) e Célestin Freinet (1896-1966), entre
outros.
Treino de habilidades
Por meio de brinquedos que
desenvolveu depois de analisar crianças de diferentes idades, Froebel previu
uma educação que ao mesmo tempo permite o treino de habilidades que elas já
possuem e o surgimento de novas. Dessa forma seria possível aos alunos
exteriorizar seu mundo interno e interiorizar as novidades vindas de fora – um
dos fundamentos do aprendizado, segundo o pensador.
Ao mesmo tempo que pensou sobre a
prática escolar, ele se dedicou a criar um sistema filosófico que lhe desse
sustentação. Para Froebel, a natureza era a manifestação de Deus no mundo
terreno e expressava a unidade de todas as coisas. Da totalidade em Deus
decorria uma lei da convivência dos contrários. Isso tudo levava ao princípio
de que a educação deveria trabalhar os conceitos de unidade e harmonia, pelos
quais as crianças alcançariam a própria identidade e sua ligação com o eterno.
A importância do autoconhecimento não se limitava à esfera individual, mas
seria ainda um meio de tornar melhor a vida em sociedade.
Além do misticismo e da unidade,
a natureza continha, de acordo com Froebel, um sistema de símbolos conferido
por Deus. Era necessário desvendar tais símbolos para conhecer o que é o
espírito divino e como ele se manifesta no mundo. A criança, segundo o educador,
trazia em si a semente divina de tudo o que há de melhor no ser humano. Cabia à
educação desenvolver esse germe e não deixar que se perdesse.
Educação espontânea
O caminho para isso seria deixar
a criança livre para expressar seu interior e perseguir seus interesses.
Froebel adotava, assim, a idéia contemporânea do “aprender a aprender”. Para
ele, a educação se desenvolve espontaneamente. Quanto mais ativa é a mente da
criança, mais ela é receptiva a novos conhecimentos.
O ponto de partida do ensino
seriam os sentidos e o contato que eles criam com o mundo. Portanto, a educação
teria como fundamento a percepção, da maneira como ela ocorre naturalmente nos
pequenos. Isso não quer dizer que ele descartasse totalmente o ensino diretivo,
visto como um recurso legítimo caso o aluno não apresentasse o desenvolvimento
esperado. De modo geral, no entanto, a pedagogia de Froebel pode ser
considerada como defensora da liberdade.
O educador acreditava que as
crianças trazem consigo uma metodologia natural que as leva a aprender de
acordo com seus interesses e por meio de atividade prática. Ele combatia o
excesso de abstração da educação de seu tempo, argumentando que ele afastava os
alunos do aprendizado. Na primeira infância, dizia, o importante é trabalhar a
percepção e a aquisição da linguagem. No período propriamente escolar, seria a
vez de trabalhar religião, ciências naturais, matemática, linguagem e artes.
Froebel defendia a educação sem
imposições às crianças porque, segundo sua teoria, elas passam por diferentes
estágios de capacidade de aprendizado, com características específicas,
antecipando as idéias do suíço Jean Piaget (1896-1980). Froebel detectou três
estágios: primeira infância, infância e idade escolar. “Em seus escritos, ele
demonstra como a brincadeira e a fala, observadas pelo adulto, permitem
apreender o nível de desenvolvimento e a forma de relacionamento infantil com o
mundo exterior”, diz Alessandra Arce.
Froebel não fez a separação entre
religião e ensino, consagrada atualmente, mas via a educação como uma atividade
em que escola e família caminham juntas, outra característica que o aproxima da
prática contemporânea.
Brinquedos criados para aprender
Froebel considerava a Educação
Infantil indispensável para a formação da criança – e essa idéia foi aceita por
grande parte dos teóricos da educação que vieram depois dele. O objetivo das
atividades nos jardins-de-infância era possibilitar brincadeiras criativas. As
atividades e o material escolar eram determinados de antemão, para oferecer o
máximo de oportunidades de tirar proveito educativo da atividade lúdica.
Froebel desenhou círculos, esferas, cubos e outros objetos que tinham por
objetivo estimular o aprendizado. Eles eram feitos de material macio e
manipulável, geralmente com partes desmontáveis. As brincadeiras eram
acompanhadas de músicas, versos e dança. Os objetos criados por Froebel eram
chamados de “dons” ou “presentes” e havia regras para usá-los, que precisariam
ser dominadas para garantir o aproveitamento pedagógico. As brincadeiras
previstas por Froebel eram, quase sempre, ao ar livre para que a turma
interagisse com o ambiente. “Todos os jogos que envolviam os ‘dons’ começavam
com as pessoas formando círculos, movendo-se e cantando, pois assim conseguiam
atingir a perfeita unidade”, diz Alessandra Arce. Para Froebel, era importante
acostumar as crianças aos trabalhos manuais. A atividade dos sentidos e do
corpo despertaria o germe do trabalho, que, segundo o educador alemão, seria
uma imitação da criação do universo por Deus.
Para pensar
Froebel
chegou a suas conclusões sobre a psicologia infantil observando as brincadeiras
e os jogos das crianças. Diante das atividades espontâneas de seus alunos, você
já pensou que tem a oportunidade de entender a psicologia de cada um e também
de depreender algumas características da faixa etária a que eles pertencem?
PEDAGOGIA
12- Emilia Ferreiro
A psicolingüista argentina
desvendou os mecanismos pelos quais as crianças aprendem a ler e escrever, o
que levou os educadores a reverem radicalmente seus métodos.
Os livros de Emilia Ferreiro chegaram aqui nos
anos 80 e logo alcançaram grande repercussão.
Frases de Emilia Ferreiro:
“Quem tem
muito pouco, ou quase nada, merece que a escola lhe abra horizontes”
“Um dos
maiores danos que se pode causar a uma criança é levá-la a perder a confiança
na sua própria capacidade de pensar”
Emilia Ferreiro nasceu na
Argentina em 1936. Doutorou-se na Universidade de Genebra, sob orientação do
biólogo Jean Piaget, cujo trabalho de epistemologia genética (uma teoria do
conhecimento centrada no desenvolvimento natural da criança) ela continuou,
estudando um campo que o mestre não havia explorado: a escrita. A partir de
1974, Emilia desenvolveu na Universidade de Buenos Aires uma série de
experimentos com crianças que deu origem às conclusões apresentadas em
Psicogênese da Língua Escrita, assinado em parceria com a pedagoga espanhola
Ana Teberosky e publicado em 1979. Emilia é hoje professora titular do Centro
de Investigação e Estudos Avançados do Instituto Politécnico Nacional, da
Cidade do México, onde mora. Além da atividade de professora – que exerce
também viajando pelo mundo, incluindo freqüentes visitas ao Brasil –, a psicolingüista
está à frente do site www.chicosyescritores.org, em que estudantes escrevem em
parceria com autores consagrados e publicam os próprios textos.
Nenhum nome teve mais influência
sobre a educação brasileira nos últimos 20 anos do que o da psicolingüista
argentina Emilia Ferreiro. A divulgação de seus livros no Brasil, a partir de
meados dos anos 1980, causou um grande impacto sobre a concepção que se tinha
do processo de alfabetização, influenciando as próprias normas do governo para
a área, expressas nos Parâmetros Curriculares Nacionais. As obras de Emilia –
Psicogênese da Língua Escrita é a mais importante – não apresentam nenhum
método pedagógico, mas revelam os processos de aprendizado das crianças,
levando a conclusões que puseram em questão os métodos tradicionais de ensino
da leitura e da escrita. “A história da alfabetização pode ser dividida em
antes e depois de Emilia Ferreiro”, diz a educadora Telma Weisz, que foi aluna
da psicolingüista.
Emilia Ferreiro se tornou uma
espécie de referência para o ensino brasileiro e seu nome passou a ser ligado
ao construtivismo, campo de estudo inaugurado pelas descobertas a que chegou o
biólogo suíço Jean Piaget (1896-1980) na investigação dos processos de
aquisição e elaboração de conhecimento pela criança – ou seja, de que modo ela
aprende. As pesquisas de Emilia Ferreiro, que estudou e trabalhou com Piaget,
concentram o foco nos mecanismos cognitivos relacionados à leitura e à escrita.
De maneira equivocada, muitos consideram o construtivismo um método.
Tanto as descobertas de Piaget
como as de Emilia levam à conclusão de que as crianças têm um papel ativo no
aprendizado. Elas constroem o próprio conhecimento – daí a palavra
construtivismo. A principal implicação dessa conclusão para a prática escolar é
transferir o foco da escola – e da alfabetização em particular – do conteúdo
ensinado para o sujeito que aprende, ou seja, o aluno. “Até então, os
educadores só se preocupavam com a aprendizagem quando a criança parecia não
aprender”, diz Telma Weisz. “Emilia Ferreiro inverteu essa ótica com resultados
surpreendentes.”
Idéias que o Brasil adotou
As pesquisas de Emilia Ferreiro e
o termo construtivismo começaram a ser divulgados no Brasil no início da década
de 1980. As informações chegaram primeiro ao ambiente de congressos e simpósios
de educadores. O livro-chave de Emilia, Psicogênese da Língua Escrita, saiu em
edição brasileira em 1984. As descobertas que ele apresenta tornaram-se assunto
obrigatório nos meios pedagógicos e se espalharam pelo Brasil com rapidez, a
ponto de a própria autora manifestar sua preocupação quanto à forma como o
construtivismo estava sendo encarado e transposto para a sala de aula. Mas o
construtivismo mostrou sua influência duradoura ao ser adotado pelas políticas
oficiais de vários estados brasileiros. Uma das experiências mais abrangentes
se deu no Rio Grande do Sul, onde a Secretaria Estadual de Educação criou um
Laboratório de Alfabetização inspirado nas descobertas de Emilia Ferreiro.
Hoje, o construtivismo é a fonte da qual derivam várias das diretrizes oficiais
do Ministério da Educação. Segundo afirma a educadora Telma Weisz na
apresentação de uma das reedições de Psicogênese da Língua Escrita, "a
mudança da compreensão do processo pelo qual se aprende a ler e a escrever afetou
todo o ensino da língua", produzindo "experimentação pedagógica
suficiente para construir, a partir dela, uma didática".
Etapas de aprendizado
Segundo Emilia, a construção do
conhecimento da leitura e da escrita tem uma lógica individual, embora aberta à
interação social, na escola ou fora dela. No processo, a criança passa por
etapas, com avanços e recuos, até se apossar do código lingüístico e dominá-lo.
O tempo necessário para o aluno transpor cada uma das etapas é muito variável.
Duas das conseqüências mais importantes do construtivismo para a prática de
sala de aula são respeitar a evolução de cada criança e compreender que um
desempenho mais vagaroso não significa que ela seja menos inteligente ou
dedicada do que as demais. Outra noção que se torna importante para o professor
é que o aprendizado não é provocado pela escola, mas pela própria mente das
crianças e, portanto, elas já chegam a seu primeiro dia de aula com uma bagagem
de conhecimentos. “Emilia mostrou que a construção do conhecimento se dá por
seqüências de hipóteses”, diz Telma Weisz.
De acordo com a teoria exposta em
Psicogênese da Língua Escrita, toda criança passa por quatro fases até que
esteja alfabetizada:
• pré-silábica: não consegue
relacionar as letras com os sons da língua falada;
• silábica: interpreta a letra a
sua maneira, atribuindo valor de sílaba a cada uma;
• silábico-alfabética: mistura a
lógica da fase anterior com a identificação de algumas sílabas;
• alfabética: domina, enfim, o
valor das letras e sílabas.
O princípio de que o processo de
conhecimento por parte da criança deve ser gradual corresponde aos mecanismos
deduzidos por Piaget, segundo os quais cada salto cognitivo depende de uma assimilação
e de uma reacomodação dos esquemas internos, que necessariamente levam tempo. É
por utilizar esses esquemas internos, e não simplesmente repetir o que ouvem,
que as crianças interpretam o ensino recebido. No caso da alfabetização, isso
implica uma transformação da escrita convencional dos adultos. Para o
construtivismo, nada mais revelador do funcionamento da mente de um aluno do
que seus supostos erros, porque evidenciam como ele “releu” o conteúdo
aprendido. O que as crianças aprendem não coincide com aquilo que lhes foi
ensinado.
Compreensão do conteúdo
Com base nesses pressupostos,
Emilia Ferreiro critica a alfabetização tradicional, porque julga a prontidão
das crianças para o aprendizado da leitura e da escrita por meio de avaliações
de percepção (capacidade de discriminar sons PARA PENSAR e sinais, por exemplo)
e de motricidade (coordenação, orientação espacial etc.). Dessa forma, dá-se
peso excessivo para um aspecto exterior da escrita (saber desenhar as letras) e
deixa-se de lado suas características conceituais, ou seja, a compreensão da
natureza da escrita e sua organização. Para os construtivistas, o aprendizado
da alfabetização não ocorre desligado do conteúdo da escrita.
É por não levar em conta o ponto
mais importante da alfabetização que os métodos tradicionais insistem em
introduzir os alunos à leitura com palavras aparentemente simples e sonoras
(como babá, bebê, papa), mas que, do ponto de vista da assimilação das
crianças, simplesmente não se ligam a nada. Segundo o mesmo raciocínio
equivocado, o contato da criança com a organização da escrita é adiado para
quando ela já for capaz de ler as palavras isoladas, embora as relações que ela
estabelece com os textos inteiros sejam enriquecedoras desde o início.
Compreender a escrita interiormente significa compreender um código social. Por
isso, segundo Emilia Ferreiro, a alfabetização também é uma forma de se
apropriar das funções sociais da escrita. De acordo com suas conclusões,
desempenhos díspares apresentados por crianças de classes sociais diferentes na
alfabetização não revelam capacidades desiguais, mas o acesso maior ou menor a
textos lidos e escritos desde os primeiros anos de vida.
Para pensar
Segundo
os construtivistas, não se aprende por pedacinhos, mas por mergulhos em conjuntos
de problemas que envolvem vários conceitos simultaneamente. No caso da
alfabetização, utilizar textos do cotidiano é muito mais produtivo do que
seguir uma cartilha. Isso não quer dizer que o ensino não deva ser objeto de
planejamento e sistematização. Você, professor, costuma ficar atento ao que
cada aluno já sabe para fazer com que avance, em ritmo próprio?
PEDAGOGIA
13- Donald Winnicott
Este médico inglês enfatizou a
importância de brincar e de criar para a criança
Winnicott defende a ideia de que a
personalidade de uma pessoa é feita através de experiências da infância
Frases de Donald Winnicott:
"O
precursor do espelho é o rosto da mãe."
"O
buscar só pode vir a partir do funcionamento amorfo e desconexo, ou talvez do
brincar rudimentar, como se em uma zona neutra. É apenas aqui, nesse estado não
integrado da personalidade, que o criativo, tal como o descrevemos, pode
emergir."
O psicanalista Donald Winnicott
trabalhava com crianças separadas de suas famílias em consequência da Segunda
Guerra Mundial quando encontrou um interessante campo de estudo que lhe
permitiu perceber etapas fundamentais do desenvolvimento da pessoa. Donald
Winnicott constatou, por exemplo, a importância do brincar e dos primeiros anos
de vida na construção da identidade pessoal. As conclusões a que ele chegou são
preciosas para o trabalho dos educadores.
Boa parte dos conceitos de
Winnicott se refere ao "desenvolvimento emocional primitivo", cujos
efeitos, segundo ele, são de importância crucial para o indivíduo por se estenderem
para além da infância. Muitos problemas da fase adulta estariam vinculados a
disfunções ocorridas entre a criança e o "ambiente", representado
geralmente pela mãe.
Os conceitos de verdadeiro e
falso self (em inglês, palavra que se refere à própria pessoa) são um bom
exemplo. "O self se forma com base nas experiências que o bebê
acumula", diz o psicanalista Davy Bogomoletz, de São Paulo. "É aquilo
que, embora indefinível, faz o indivíduo sentir que ele é único." A
relação com a mãe leva o bebê a administrar a própria espontaneidade e as
expectativas externas. "Se a mãe aceitar as manifestações do bebê - como a
fome, o desconforto, o prazer e a vontade -, em vez de impor o que acredita ser
o certo, o bebê vai acumulando experiências nas quais ele é sempre o sujeito, e
o self que se forma pode então ser considerado verdadeiro", explica
Bogomoletz. Porém o self construído em torno da vontade alheia é o que
Winnicott chama de falso e que priva o indivíduo de liberdade e de
criatividade.
Aconchego e proteção
Uma das frases famosas de
Winnicott é "não existe essa coisa chamada bebê", querendo dizer que
não há criança sem uma mãe (que não precisa ser necessariamente a que deu à
luz). Vem daí a idéia da "mãe suficientemente boa", aquela cuja percepção
- consciente ou inconsciente - das necessidades do bebê a leva a responder
adequadamente aos diferentes estágios do desenvolvimento dele. Isso faz com que
se crie um ambiente - nomeado por Winnicott de holding (cuja melhor tradução
para o português, segundo Bogomoletz, seria "colo") - propício a um
processo de formação de um ser humano independente. "O holding é o
somatório de aconchego, percepção, proteção e alegria fornecidos pela
mãe", diz ele. Começa como algo vital, como o oxigênio e a alimentação, e
se dilui conforme o bebê cresce.
"Os educadores devem
fornecer holding no ambiente escolar", segundo Bogomoletz. Isso significa
tratar cada aluno como ele precisa. O termo "inclusão", se levado a
sério, indica uma atitude de holding. O acolhimento adequado pode, portanto,
ajudar uma criança regida por um self falso - geralmente boazinha e obediente -
a se tornar mais espontânea. "No entanto, é preciso que a escola aceite as
temporadas de 'mau comportamento'. "Trata-se de adotar sempre uma postura tolerante
e criar condições para que a criança desfrute de liberdade. Nada mais
importante, nesse sentido, do que o papel da brincadeira - fundamental para
Winnicott, não apenas na infância, por misturar e conciliar o manejo do mundo
objetivo e a imaginação. "Brincar pressupõe segurança e
criatividade", diz Bogomoletz. "Crianças com problemas emocionais
graves não brincam, pois não conseguem ser criativas."
O cobertorzinho
O movimento da psique entre o
mundo das coisas e as fabricações da mente é uma atividade
"transicional", adjetivo fundamental na obra de Winnicott. O conceito
mais conhecido é o de "objeto transicional", representado
classicamente pelo cobertorzinho a que muitos pequenos se agarram numa
determinada fase. "Esse objeto é ao mesmo tempo uma coisa objetiva -
existe num mundo compartilhado - e subjetiva - para seu dono, ele faz parte de
uma fantasia, possui vida própria", explica Bogomoletz.
Dessa forma, o objeto
transicional prolonga o período em que o bebê se acredita onipotente, enquanto
ele substitui essa crença com a aceitação de uma realidade sobre a qual não tem
controle nem pode modificar por meio da imaginação. O bebê se vê com poderes
mágicos e, com o tempo, percebe a ilusão. Mas, com as brincadeiras e o
aprendizado do mundo, a criança, o adolescente e o adulto retêm o poder de
criar e adaptam-se às possibilidades reais. "A fantasia é realmente a
marca do humano", diz Bogomoletz. "Já a objetividade é uma habilidade
que se aprende, como uma segunda língua."
"A escola tem a obrigação de
ajudar a criança a completar essa transição do modo mais agradável possível,
respeitando o direito de devanear, imaginar, brincar", prossegue o
psicanalista. O respeito que os pequenos terão pela objetividade será
incorporado por eles, jamais imposto de fora para dentro. Quando livres para
criar, eles, segundo Winnicott, vêem no estudo um modo de exercitar o poder de
invenção. Se, no entanto, o ambiente escolar não for aberto à brincadeira,
"os recreios serão tanto mais selvagens quanto as aulas forem mais opressoras
ou supostamente sérias".
Formação nos campos de guerra
Donald Woods Winnicott nasceu em
1896 numa família rica de comerciantes em Plymouth, na Inglaterra. Ao entrar na
faculdade de Medicina, foi convocado para servir como enfermeiro na Primeira Guerra
Mundial, na qual fez as primeiras observações sobre o comportamento humano em
situações traumáticas. Especializou-se em pediatria, trabalhando 40 anos no
Hospital Infantil Paddington. Paralelamente, preparou-se para ser psicanalista.
Trabalhou como consultor psiquiátrico do governo, tratando de crianças
afastadas dos pais na Segunda Guerra Mundial. Em 1949, separou-se da primeira
mulher, a artista plástica Alice Taylor. Dois anos depois, casou-se com Clare
Britton, psicanalista e organizadora dos trabalhos do marido. Foi presidente da
Sociedade Britânica de Psicanálise e morreu em Londres, em 1971.
Análise da própria infância e
marcas da psicanálise
O
interesse de Winnicott pelo estudo da construção da identidade veio da
percepção da influência sufocante da mãe depressiva em sua personalidade. Ainda
criança, Winnicott enveredou pelos caminhos da observação científica ao ler os
estudos do naturalista Charles Darwin (1809-1892). Já pediatra, conheceu a obra
de Sigmund Freud (1856-1939), fez terapia e freqüentou o grupo de Bloomsbury -
integrado, entre outros, pela escritora Virginia Woolf (1882-1941) -, em que a
psicanálise era tema recorrente. Seu trabalho chega ao Brasil com a criação de
várias instituições winnicottianas.
PEDAGOGIA
14- Célestin Freinet
O educador francês desenvolveu
atividades hoje comuns, como as aulas-passeio e jornal de classe, e criou um
projeto de escola moderna e democrática.
Freinet se identificava com a
corrente da Escola Nova, anti-conservadora.
Frases de Célestin Freinet:
"A
democracia de amanhã se prepara na democracia da escola"
"Se
não encontrarmos respostas adequadas a todas as questões sobre educação,
continuaremos a forjar almas de escravos em nossos filhos"
Célestin Freinet nasceu em 1896
em Gars, povoado na região da Provence, sul da França. Foi pastor de rebanhos
antes de começar a cursar o magistério. Lutou na Primeira Guerra Mundial em
1914, quando os gases tóxicos do campo de batalha afetaram seus pulmões para o
resto da vida. Em 1920, começou a lecionar na aldeia de Bar-sur-Loup, onde pôs
em prática alguns de seus principais experimentos, como a aula-passeio e o
livro da vida. Em 1925, filiou-se ao Partido Comunista Francês. Dois anos
depois, fundou a Cooperativa do Ensino Leigo, para desenvolvimento e intercâmbio
de novos instrumentos pedagógicos. Em 1928, já casado com Élise Freinet (que se
tornaria sua parceira e divulgadora), mudou-se para Saint-Paul de Vence,
iniciando intensa atividade. Cinco anos depois, foi exonerado do cargo de
professor. Em 1935, o casal Freinet construiu uma escola própria em Vence.
Durante a Segunda Guerra, o educador foi preso e adoeceu num campo de
concentração alemão. Libertado depois de um ano, aderiu à resistência francesa
ao nazismo. Recobrada a paz, Freinet reorganizou a escola e a cooperativa em
Vence. Em 1956, liderou a vitoriosa campanha 25 Alunos por Classe.
No ano seguinte, os seguidores de
Freinet fundaram a Federação Internacional dos Movimentos da Escola Moderna
(Fimem), que hoje reúne educadores de cerca de 40 países. Freinet morreu em
1966.
Muitos dos conceitos e atividades
escolares idealizados pelo pedagogo francês Célestin Freinet se tornaram tão
difundidos que há educadores que os utilizam sem nunca ter ouvido falar no
autor. É o caso das aulas-passeio (ou estudos de campo), dos cantinhos
pedagógicos e da troca de correspondência entre escolas. Não é necessário
conhecer a fundo a obra de Freinet para fazer bom uso desses recursos, mas
entender a teoria que motivou sua criação deverá possibilitar sua aplicação integrada
e torná-los mais férteis.
Freinet se inscreve,
historicamente, entre os educadores identificados com a corrente da Escola
Nova, que, nas primeiras décadas do século 20, se insurgiu contra o ensino
tradicionalista, centrado no professor e na cultura enciclopédica, propondo em
seu lugar uma educação ativa em torno do aluno. O pedagogo francês somou ao
ideário dos escolanovistas uma visão marxista e popular tanto da organização da
rede de ensino como do aprendizado em si. "Freinet sempre acreditou que é
preciso transformar a escola por dentro, pois é exatamente ali que se
manifestam as contradições sociais", diz Rosa Maria Whitaker Sampaio,
coordenadora do pólo São Paulo da Federação Internacional dos Movimentos da
Escola Moderna (Fimem), que congrega seguidores de Freinet.
Na teoria do educador francês, o
trabalho e a cooperação vêm em primeiro plano, a ponto de ele defender, em
contraste com outros pedagogos, incluindo os da Escola Nova, que "não é o
jogo que é natural da criança, mas sim o trabalho". Seu objetivo declarado
é criar uma "escola do povo".
Importância do êxito
Não foi por acaso que Freinet
criou uma pedagogia do trabalho. Para ele, a atividade é o que orienta a
prática escolar e o objetivo final da educação é formar cidadãos para o trabalho
livre e criativo, capaz de dominar e transformar o meio e emancipar quem o
exerce. Um dos deveres do professor, segundo Freinet, é criar uma atmosfera
laboriosa na escola, de modo a estimular as crianças a fazer experiências,
procurar respostas para suas necessidades e inquietações, ajudando e sendo
ajudadas por seus colegas e buscando no professor alguém que organize o
trabalho.
Outra função primordial do
professor, segundo Freinet, é colaborar ao máximo para o êxito de todos os
alunos. Diferentemente da maioria dos pedagogos modernos, o educador francês
não via valor didático no erro. Ele acreditava que o fracasso desequilibra e
desmotiva o aluno, por isso o professor deve ajudá-lo a superar o erro.
"Freinet descobriu que a forma mais profunda de aprendizado é o
envolvimento afetivo", diz Rosa Sampaio.
Ao lado da pedagogia do trabalho
e da pedagogia do êxito, Freinet propôs, finalmente, uma pedagogia do bom
senso, pela qual a aprendizagem resulta de uma relação dialética entre ação e
pensamento, ou teoria e prática. O professor se pauta por uma atitude orientada
tanto pela psicologia quanto pela pedagogia - assim, o histórico pessoal do
aluno interage com os conhecimentos novos e essa relação constrói seu futuro na
sociedade.
Livre expressão
Esse aspecto muito particular que
atribuía ao aprendizado de cada criança é a razão de Freinet não ter criado um
método pedagógico rígido, nem uma teoria propriamente científica. Mesmo assim,
seu entendimento sobre os mecanismos do aprendizado mereceu elogios do biólogo
suíço Jean Piaget (1896-1980), cuja teoria do conhecimento se baseou em
minuciosa observação científica.
Freinet dedicou a vida a elaborar
técnicas de ensino que funcionam como canais da livre expressão e da atividade
cooperativa, com o objetivo de criar uma nova educação. Lançou-se a essa tarefa
por considerar a escola de seu tempo uma instituição alienada da vida e da
família, feita de dogmas e de acumulação estéril de informação - e, além disso,
em geral a serviço apenas das elites. "Freinet colocou professor e alunos
no mesmo nível de igualdade e camaradagem", diz Rosa Sampaio. O educador
não se opunha, porém, às aulas teóricas. A primeira das novas técnicas didáticas
desenvolvidas por Freinet foi a aula-passeio, que nasceu justamente da
observação de que as crianças para quem lecionava, que se comportavam tão
vividamente quando ao ar livre, pareciam desinteressadas dentro da escola. Uma
segunda criação célebre, a imprensa na escola, respondeu à necessidade de
eliminar a distância entre alunos e professores e de trazer para a classe a
vida "lá fora". "É necessário fazer nossos filhos viver em
república desde a escola", escreveu Freinet.
A pedagogia de Freinet se
fundamenta em quatro eixos: a cooperação (para construir o conhecimento
comunitariamente), a comunicação (para formalizá-lo, transmiti-lo e
divulgá-lo), a documentação, com o chamado livro da vida (para registro diário
dos fatos históricos), e a afetividade (como vínculo entre as pessoas e delas
com o conhecimento).
Cooperação sim, manuais não
Com a intenção de propor uma
reforma geral no ensino francês, Freinet reuniu suas experiências didáticas num
sistema que denominou Escola Moderna. Entre as principais "técnicas Freinet"
estão a correspondência entre escolas (para que os alunos possam não apenas
escrever, mas ser lidos), os jornais de classe (mural, falado e impresso), o
texto livre (nascido do estímulo para que os alunos registrem por escrito suas
idéias, vivências e histórias), a cooperativa escolar, o contato freqüente com
os pais (Freinet defendia que a escola deveria ser extensão da família) e os
planos de trabalho. O pedagogo era contrário ao uso de manuais em sala de aula,
sobretudo as cartilhas, por considerá-los genéricos e alheios às necessidades
de expressão das crianças. Defendia que os alunos fossem em busca do
conhecimento de que necessitassem em bibliotecas (que deveriam existir na
própria escola) e que confeccionassem fichários de consulta e de autocorreção
(para exercícios de Matemática, por exemplo). Para Freinet, todo conhecimento é
fruto do que chamou de tateamento experimental - a atividade de formular
hipóteses e testar sua validade - e cabe à escola proporcionar essa
possibilidade a toda criança.
Para pensar
A
utilização de técnicas desenvolvidas por Freinet, em particular as
aulas-passeio e os cantinhos temáticos na sala de aula, não significam por si
só que o professor adotou uma prática freinetiana. É preciso lembrar que o
educador francês criou tais recursos para atingir um objetivo maior, que é o
despertar, nas crianças, de uma consciência de seu meio, incluindo os aspectos
sociais, e de sua história. Quando você promove atividades em sua escola,
costuma ter consciência de como elas se inserem num plano pedagógico mais
amplo?
PEDAGOGIA
15- Carl Rogers
Para o fundador da terapia
não-diretiva, a tarefa de professor é liberar o caminho para que o estudante
aprenda o que quiser
Na Educação e na psicologia, Rogers se opôs às
práticas dominantes na sociedade
Frases de Carl Rogers:
"Toda
a nossa cultura procura insistentemente manter os jovens afastados do contato
com os problemas reais. Será possível inverter essa tendência?"
"A
única coisa que se aprende e realmente faz diferença no comportamento da pessoa
que aprende é a descoberta de si mesma"
Carl Ransom Rogers nasceu em Oak
Park, perto de Chicago, em 1902. Teve uma infância isolada e uma educação
fortemente marcada pela religião. Tornou-se pastor e encaminhou os estudos para
a teologia, quando começou a se interessar por psicologia. Na nova carreira, o
primeiro foco de trabalho foram crianças submetidas a abusos e maus-tratos. Por
essa época começou, por observação, a desenvolver suas teorias sobre
personalidade e prática terapêutica. Aos 40 anos publicou o primeiro livro.
Seguiram-se mais de 100 publicações destinadas a divulgar suas idéias, que
ganharam seguidores em todo o mundo. Rogers quis provocar uma ruptura na
psicologia, dando a condução do tratamento ao cliente, e não temeu acusar de
autoritários a maioria dos métodos hegemônicos na área. O pilar da terapia
rogeriana são os "grupos de encontro", em que vários clientes
interagem. Rogers foi um dos primeiros a gravar e filmar as sessões de terapia.
Morreu de um ataque cardíaco em 1987, em San Diego, Califórnia.
As idéias do norte-americano Carl
Rogers para a educação são uma extensão da teoria que desenvolveu como
psicólogo. Nos dois campos sua contribuição foi muito original, opondo-se às
concepções e práticas dominantes nos consultórios e nas escolas. A terapia
rogeriana se define como não-diretiva e centrada no cliente (palavra que Rogers
preferia a paciente), porque cabe a ele a responsabilidade pela condução e pelo
sucesso do tratamento. Para Rogers, o terapeuta apenas facilita o processo. Em
seu ideal de ensino, o papel do professor se assemelha ao do terapeuta e o do
aluno ao do cliente. Isso quer dizer que a tarefa do professor é facilitar o
aprendizado, que o aluno conduz a seu modo.
A teoria rogeriana - que tem como
característica um extenso repertório de expressões próprias - surgiu como uma
terceira via entre os dois campos predominantes da psicologia em meadosdo
século 20. De um lado havia a psicanálise, criada por Sigmund Freud
(1856-1939), com sua prática balizada pela ortodoxia, e, de outro, o
behaviorismo, que na época tinha B. F. Skinner (1904-1990) como expoente e se
caracteriza pela submissão à biologia. A corrente de Rogers ficou conhecida
como humanista, porque, em acentuado contraste com a teoria freudiana, ela se
baseia numa visão otimista do homem.
Ao mesmo tempo, sustentava que o
organismo humano - assim como todos os outros, incluindo o das plantas - possui
uma tendência à atualização, que tem como fim a autonomia. Na teoria rogeriana,
essa é a única força motriz dos seres vivos. No caso particular dos seres
humanos, segundo Rogers, o processo constante de atualização gerou a abertura a
novas experiências, capacidade de viver o aqui e o agora, confiança nos
próprios desejos e intuições, liberdade e responsabilidade de agir e
disponibilidade para criar.
Já que se tornar uma pessoa
saudável é, basicamente, uma questão de ouvir a si mesma e satisfazer os
próprios desejos (ou interesses), as melhores qualidades de um terapeuta ou de
um professor são saber facilitar esses processos e interferir o menos possível.
É esse o significado do termo "não-diretivo", a marca registrada do
rogerianismo. Para que o terapeuta ou o professor seja capaz de exercer tal
papel, três qualidades são requeridas: congruência - ser autêntico com o
cliente/aluno; empatia - compreender seus sentimentos; e respeito -
"consideração positiva incondicional", no jargão rogeriano. "O
difícil na teoria rogeriana é mudar a postura diante do outro e não se
surpreender com o que é humano", diz Ana Gracinda. Em grande parte, para
Rogers, a chave do ensino produtivo é uma questão de ética.
Teoria adequada a um tempo de
contestação
Nascido no meio rural, Carl
Rogers foi marcado por toda a vida pela idéia da natureza e pelo fenômeno do
crescimento - o objetivo de sua terapia era crescimento pessoal e não uma idéia
estática de maturidade emocional -, o que o levou a se aprofundar no estudo da
obra do educador e filósofo norteamericano John Dewey (1859-1952). Como alguém
cujo tempo de vida quase coincidiu com o século 20, Rogers teve a possibilidade
de testemunhar o surgimento de várias correntes psicológicas e a disseminação
da psicoterapia - um conhecimento indispensável para que, por oposição, ele
criasse a sua própria corrente. O aspecto marcadamente antiautoritário e
anticonvencional de seu pensamento o tornou muito atraente nos anos 1960,
durante o auge da contracultura, representada em parte pelo movimento hippie.
No Brasil, a influência de Rogers também se deu por essa época, em particular
na formação de orientadores educacionais. "Os orientadores agiam em grande
parte como mediadores de conflito e o conhecimento de Rogers permitia que eles
pudessem exercer a função sem punições, mas também sem fechar os olhos para os
problemas", diz a educadora Ana Gracinda Queluz.
Para pensar
Uma
crítica que se costuma fazer à influência de Rogers na educação é que suas
idéias incentivam uma liberdade sem limites, permitindo que os alunos façam o
que querem, levando à indisciplina e ao individualismo. Outra objeção comum,
desta vez no campo teórico, é que Rogers via os seres humanos com excessiva
benevolência, sem levar em consideração possíveis impulsos inatos para a
agressividade, a competição ou a autodestruição. Baseado em sua experiência em
sala de aula, qual é sua opinião? É possível fundamentar a prática pedagógica
na idéia de que todo aluno tem tendência natural ao aprendizado e a relações
interpessoais construtivas?
PEDAGOGIA
16- Anton Makarenko
O mestre ucraniano concebeu um
modelo de escola baseado na vida em grupo, na autogestão e na disciplina,
contribuindo para a recuperação de jovens infratores.
Mais que educar, com rigidez e disciplina,
Makarenko quis formar personalidades.
Frase de Anton Makarenko:
"É
preciso mostrar aos alunos que o trabalho e a vida deles são parte do trabalho
e da vida do país"
Anton Semionovich Makarenko
nasceu em 1888 na Ucrânia, filho de um operário ferroviário e de uma
dona-de-casa. Aprendeu a ler e escrever com a mãe, como a maioria das crianças
da época, e logo depois foi matriculado numa escola primária. Lá teve acesso às
disciplinas de língua russa, aritmética, geografia, história, ciências
naturais, física, desenho, canto, ginástica e catecismo, mas não pôde estudar
sua língua materna, a ucraniana, proibida pelo império czarista na Rússia, nem
lógica e filosofia, exclusivas da elite. Aos 17 anos, Makarenko concluiu o
curso de magistério e entrou em contato com as idéias revolucionárias de Lênin
e Máximo Gorki, que influenciaram sua visão de mundo e de educação. Sua
primeira experiência em sala de aula ocorreu em 1906, na Escola Primária das
Oficinas Ferroviárias, onde lecionou por oito anos. Em seguida, assumiu a
direção de uma escola secundária. Mais consciente do modelo de educação que
queria aplicar, ampliou o espaço cultural e mudou o currículo com a ajuda de
pais e professores. E estabeleceu o ensino da língua ucraniana. Sua mais
marcante experiência deu-se de 1920 a 1928, na direção da Colônia Gorki,
instituição rural que atendia crianças e jovens órfãos que haviam vivido na
marginalidade. Lá ele pôs em prática um ensino que privilegiava a vida em
comunidade, a participação da criança na organização da escola, o trabalho e a
disciplina. Publicou novelas, peças de teatro e livros sobre educação, sendo
Poema Pedagógico o mais importante. Morreu de ataque cardíaco durante uma
viagem de trem em 1939, ano que ficaria marcado pelo início da Segunda Guerra
Mundial.
Imagine um educador que tem como
missão dirigir um colégio interno (na zona rural) cheio de crianças e jovens
infratores, muitos órfãos, que mal sabiam ler e escrever, numa época em que o
modelo de escola e de sociedade estavam em xeque. Como educar? Por onde
começar? Anton Semionovich Makarenko, professor na Ucrânia, país do leste
europeu que era parte da União Soviética na época, foi um dos homens que
ajudaram a responder a essas questões e a repensar o papel da escola e da
família na recém-criada sociedade comunista, no início do século 20. Sua
pedagogia tornou-se conhecida por transformar centenas de crianças e
adolescentes marginalizados em cidadãos.
O método criado por ele era uma
novidade porque organizava a escola como coletividade e levava em conta os
sentimentos dos alunos na busca pela felicidade - aliás, um conceito que só
teria sentido se fosse para todos. O que importava eram os interesses da
comunidade e a criança tinha direitos impensáveis na época, como opinar e
discutir suas necessidades no universo escolar. "Foi a primeira vez que a
infância foi encarada com respeito e direitos", diz Cecília da Silveira
Luedemann, educadora e autora do livro Anton Makarenko, Vida e Obra - A
Pedagogia na Revolução.
Mais que educar, com rigidez e
disciplina, ele quis formar personalidades, criar pessoas conscientes de seu
papel político, cultas, sadias e que se tornassem trabalhadores preocupados com
o bem-estar do grupo, ou seja, solidários. Na sociedade comunista de então, o
trabalho era considerado essencial para a formação do homem, não apenas um
valor econômico. Makarenko aprendeu tudo na prática, na base de acertos e
erros, primeiro na escola da Colônia Gorki e, em seguida, na Comuna Dzerjinski.
Cada etapa de suas experiências foi registrada em relatórios, textos e livros.
As dificuldades e os desafios têm muitos paralelos com os dos professores de
hoje. A saída encontrada há quase um século correspondia às necessidades da
época, mas servem de reflexão para buscar soluções atuais e entender a educação
no mundo.
Proteger a infância
A idéia do coletivo surge como
respeito a cada aluno, oposta à visão de massificação que despersonaliza a
criança. O grupo estimula o desenvolvimento individual. Como a instituição
familiar (e tudo o mais na então União Soviética) estava em crise, essa foi a
alternativa encontrada pelo educador para proteger a infância de seu país. O
sentimento de grupo não era uma idéia abstrata. Tinha raízes nos ideais
revolucionários e Makarenko soube como transformá-la em algo concreto. A
colônia era auto-suficiente e a sobrevivência de cada um dependia do trabalho
de todos. Caso contrário, não haveria comida nem condições de habitação
aceitáveis.
Valorizar a disciplina
Para que a vida em comunidade
desse certo é essencial que cada aluno tivesse claras suas responsabilidades.
"Nunca mais ladrões nem mendigos: somos os dirigentes." Makarenko era
conhecido como um educador aberto, mas rígido e duro. Ele acreditava que o
planejamento e o cumprimento das metas estabelecidas por todos só se
concretizariam com uma direção muito firme. Por isso, os alunos tinham
consciência de que a disciplina não era um fim, mas um meio para o sucesso da vida
na escola. O descumprimento de uma norma podia ser punido severamente, desde
que alunos e professores assim o desejassem, depois de muita discussão.
Envolver a família
Makarenko publicou em 1938,
incompleto, o Livro dos Pais. O objetivo era mostrar a importância da
participação da família na escola e como educar as crianças em tempos difíceis.
Alguns estudantes moravam nas escolas dirigidas por ele. O educador ucraniano
fazia questão da presença dos pais, que eram estimulados a participar de
atividades culturais e recreativas. A escola tinha o papel de orientar a
família, que deveria encará-la como um órgão normativo. Pais muito
"melosos" ou ausentes seriam incapazes de educar uma pessoa forte,
madura e inteligente. "O carinho, como o jogo e a comida, exige certa
dosagem", dizia.
Makarenko na escola: o aluno
ganha voz
Makarenko queria formar crianças
capazes de dirigir a própria vida no presente e a vida do país no futuro.
Exercícios físicos, trabalhos manuais, recreação, excursões, aulas de música e
idas ao teatro faziam parte da rotina. A escola tinha que permitir o contato
com a sociedade e com a natureza, ou seja, ser um lugar para o jovem viver a
realidade concreta e participar das decisões sociais.
O estudo do meio já era comum na
escola de Makarenko, ainda que sem esse nome. Na Colônia Gorki, meninos e
meninas eram divididos em grupos de dez, de diferentes faixas etárias. Um
representante de cada turma participava de assembléias e reuniões em que se
discutiam as situações da escola: um objeto roubado, a melhoria do prédio, a
compra de materiais, a limpeza dos banheiros, os problemas particulares. Sexo e
namoro também tinham espaço nas reuniões. Normas e decisões não podiam ser
predeterminadas. O primeiro e o último voto eram sempre dos alunos.
Para pensar
Makarenko
talvez tenha sido o educador que levou às conseqüências mais radicais as
questões do espírito de grupo e do trabalho coletivo. Tudo era discutido entre
alunos, professores e a direção da Colônia Gorki e da Comuna Dzerjinski. Por
essa razão, embora tenha vivido numa época e num contexto totalmente diferentes
dos atuais, vale a pena conhecer suas idéias e pensar sobre elas. Mas será que
as crianças e os jovens atuais conhecem de fato o significado de grupo? Ou a
idéia de coletivo é abstrata? Os jovens se sentem responsáveis pela escola e
pelo bem-estar de seus colegas? "Precisamos pensar se estamos formando
pessoas cada vez mais individualistas ou coletivas", diz a educadora
Cecília da Silveira Luedemann. Estamos realmente educando para a colaboração e
a solidariedade? A obra de Makarenko provoca ainda uma reflexão sobre a
disciplina. Estamos sendo permissivos demais? Como atingir o equilíbrio entre
limites e liberdade? Makarenko dá algumas respostas. Podemos não concordar
totalmente com elas, mas é inegável que seu trabalho produziu resultados
positivos num momento de grandes dificuldades sociais. Não estaremos nós em
momento equivalente?
PEDAGOGIA
17- Anísio Teixeira
O educador propôs e executou
medidas para democratizar o ensino brasileiro e defendeu a experiência do aluno
como base do aprendizado.
Anísio Teixeira foi um dos idealizadores do
movimento Escola Nova nos anos 30.
Frase de Anísio Teixeira:
“Democracia,
essencialmente, é o modo de vida social em que cada indivíduo conta como uma
pessoa”
Anísio Spínola Teixeira nasceu em 12 de julho
de 1900 em Caetité (BA). Filho de fazendeiro, estudou em colégios de jesuítas
na Bahia e cursou direito no Rio de Janeiro. Diplomou-se em 1922 e em 1924 já
era inspetor-geral do Ensino na Bahia. Viajando pela Europa em 1925, observou
os sistemas de ensino da Espanha, Bélgica, Itália e França e com o mesmo
objetivo fez duas viagens aos Estados Unidos entre1927 e 1929. De volta ao
Brasil, foi nomeado diretor de Instrução Pública do Rio de Janeiro, onde criou
entre 1931 e 1935 uma rede municipal de ensino que ia da escola primária à
universidade. Perseguido pela ditadura Vargas, demitiu-se do cargo em 1936 e
regressou à Bahia – onde assumiu a pasta da Educação em 1947. Sua atuação à
frente do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos a partir de 1952,
valorizando a pesquisa educacional no país, chegou a ser considerada tão
significativa quanto a Semana da Arte Moderna ou a fundação da Universidade de
São Paulo. Com a instauração do governo militar em 1964, deixou o instituto –
que hoje leva seu nome – e foi lecionar em universidades americanas, de onde
voltou em 1965 para continuar atuando como membro do Conselho Federal de
Educação. Morreu no Rio de Janeiro em março de 1971.
Considerado o principal idealizador das
grandes mudanças que marcaram a educação brasileira no século 20, Anísio
Teixeira foi pioneiro na implantação de escolas públicas de todos os níveis,
que refletiam seu objetivo de oferecer educação gratuita para todos. Como
teórico da educação, Anísio não se preocupava em defender apenas suas idéias.
Muitas delas eram inspiradas na filosofia de John Dewey (1852-1952), de quem
foi aluno ao fazer um curso de pós-graduação nos Estados Unidos.
Dewey considerava a educação uma constante
reconstrução da experiência. Foi esse pragmatismo, observa a professora Maria
Cristina Leal, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, que impulsionou
Anísio a se projetar para além do papel de gestor das reformas educacionais e
atuar também como filósofo da educação. A marca do pensador Anísio era uma
atitude de inquietação permanente diante dos fatos, considerando a verdade não
como algo definitivo, mas que se busca continuamente. Para o pragmatismo, o
mundo em transformação requer um novo tipo de homem consciente e bem preparado
para resolver seus próprios problemas acompanhando a tríplice revolução da vida
atual: intelectual, pelo incremento das ciências; industrial, pela tecnologia;
e social, pela democracia. Essa concepção exige, segundo Anísio, “uma educação em
mudança permanente, em permanente reconstrução”.
Educação como meta política
Nos anos 1920, com a crescente
industrialização e a urbanização em todo o mundo, a necessidade de preparar o
país para o desenvolvimento levou um grupo de intelectuais brasileiros a se
interessar pela educação – vista como elemento central para remodelar o país.
Os novos teóricos viam num sistema estatal de ensino livre e aberto o único
meio efetivo de combate às desigualdades sociais. Esse movimento chamado de
Escola Nova ganhou força nos anos 1930, principalmente após a divulgação, em
1932, do Manifesto da Escola Nova. O documento pregava a universalização da
escola pública, laica e gratuita. Entre os nomes de vanguarda que o assinaram
estavam, além de Anísio Teixeira, Fernando de Azevedo (1894-1974), que aplicou
a sociologia à educação e reformou o ensino em São Paulo nos anos 1930, o
professor Lourenço Filho (1897-1970) e a poetisa Cecília Meireles (1901-1964).
A atuação desses pioneiros se estendeu por décadas, muitas vezes criticada
pelos defensores da escola particular e religiosa. Mas eles ampliaram sua
atuação e influenciaram uma nova geração de educadores como Darcy Ribeiro
(1922-1997) e Florestan Fernandes (1920-1995). Anísio foi mentor de duas
universidades: a do Distrito Federal, no Rio de Janeiro, desmembrada pela
ditadura de Getúlio Vargas, e a de Brasília, da qual era reitor quando do golpe
militar de 1964.
Didática da ação
As novas responsabilidades da
escola eram, portanto, educar em vez de instruir; formar homens livres em vez
de homens dóceis; preparar para um futuro incerto em vez de transmitir um
passado claro; e ensinar a viver com mais inteligência, mais tolerância e mais
felicidade. Para isso, seria preciso reformar a escola, começando por dar a ela
uma nova visão da psicologia infantil.
O próprio ato de aprender, dizia Anísio,
durante muito tempo significou simples memorização; depois seu sentido passou a
incluir a compreensão e a expressão do que fora ensinado; por último, envolveu
algo mais: ganhar um modo de agir. Só aprendemos quando assimilamos uma coisa
de tal jeito que, chegado o momento oportuno, sabemos agir de acordo com o
aprendido.
Para o pensador, não se aprendem apenas idéias
ou fatos mas também atitudes, ideais e senso crítico – desde que a escola
disponha de condições para exercitá-los. Assim, uma criança só pode praticar a
bondade em uma escola onde haja condições reais para desenvolver o sentimento.
A nova psicologia da aprendizagem obriga a escola a se transformar num local
onde se vive e não em um centro preparatório para a vida. Como não aprendemos
tudo o que praticamos, e sim aquilo que nos dá satisfação, o interesse do aluno
deve orientar o que ele vai aprender. Portanto, é preciso que ele escolha suas
atividades.
Por tudo isso, na escola progressiva as
matérias escolares – Matemática, Ciências, Artes etc. – são trabalhadas dentro
de uma atividade escolhida e projetada pelos alunos, fornecendo a eles formas
de desenvolver sua personalidade no meio em que vivem. Nesse tipo de escola, estudo
é o esforço para resolver um problema ou executar um projeto, e ensinar é guiar
o aluno em uma atividade.
Para pensar
As
escolas comunitárias americanas inspiraram a concepção de ensino de tempo
integral de Anísio Teixeira. Lá, no entanto, a jornada dificilmente tem mais do
que seis horas diárias. O conceito entre nós ampliou-se consideravelmente:
escola de pelo menos oito horas e, no caso dos Cieps, uma instituição que
deveria dar conta de todas as necessidades das crianças, até mesmo de cuidados
maternos moradia. Numa realidade na qual os recursos são limitados, o problema
é de prioridades e decisões difíceis: manter uma escola com esse modelo para
uma minoria ou manter um modelo menos ambicioso para a maioria? Afinal, Anísio
também propunha uma escola para todos.
PEDAGOGIA
18- Karl Marx
O pensador alemão, um dos mais
influentes de todos os tempos, investigou a mecânica do capitalismo e previu
que o sistema seria superado pela emancipação dos trabalhadores.
Recentemente, Marx foi eleito o filósofo mais
importante da história.
Frase de Karl Marx:
“A união
entre trabalho, instrução intelectual, exercício físico e treino politécnico
elevará a classe operária”
Karl Marx nasceu em 1818 em
Trier, sul da Alemanha (então Prússia). Seu pai, advogado, e sua mãe descendiam
de judeus, mas haviam se convertido ao protestantismo. Estudou direito em Bonn
e depois em Berlim, mas se interessou mais por filosofia e história. Na
universidade, aproximou-se de grupos dedicados à política. Aos 23 anos, quando
voltou a Trier, percebeu que não seria bem-vindo nos meios acadêmicos e passou
a viver da venda de artigos. Em 1843, casou-se com a namorada de infância,
Jenny von Westphalen. O casal se mudou para Paris, onde Marx aderiu à
militância comunista, atraindo a atenção de Friedrich Engels, depois amigo e
parceiro.
Foi expulso de Paris em 1845,
indo morar na Bélgica, de onde também seria deportado. Nos anos seguintes, se
engajou cada vez mais na organização da política operária, o que despertou a
ira de governos e da imprensa. A Justiça alemã o acusou de delito de imprensa e
incitação à rebelião armada, mas ele foi absolvido nos dois casos. Expulso da
Prússia e novamente da França, Marx se estabeleceu em Londres em 1849, onde
viveu na miséria durante 15 anos, ajudado, quando possível, por Engels. Dois de
seus quatro filhos morreram no período. O isolamento político terminou em 1864,
com a fundação da Associação Internacional dos Trabalhadores (depois conhecida
como Primeira Internacional Socialista), que o adotou como líder intelectual,
após a derrota do anarquista Mikhail Bakunin. Em 1871, a eclosão da Comuna de
Paris o tornou conhecido internacionalmente. Na última década de vida, sua
militância tornou-se mais crítica e indireta. Marx morreu em 1883, em Londres.
Numa de suas frases mais famosas,
escrita em 1845, o pensador alemão Karl Marx (1818-1883) dizia que, até então,
os filósofos haviam interpretado o mundo de várias maneiras. “Cabe agora
transformá-lo”, concluía. Coerentemente com essa idéia, durante sua vida
combinou o estudo das ciências humanas com a militância revolucionária, criando
um dos sistemas de idéias mais influentes da história. Direta ou indiretamente,
a obra do filósofo alemão originou várias vertentes pedagógicas comprometidas
com a mudança da sociedade. “A educação, para Marx, participa do processo de
transformação das condições sociais, mas, ao mesmo tempo, é condicionada pelo
processo”, diz Leandro Konder, professor da Pontifícia Universidade Católica do
Rio de Janeiro.
No século 20, o pensamento de
Marx foi submetido a numerosas interpretações, agrupadas sob a classificação de
“marxismo”. Algumas sustentaram regimes políticos duradouros, como o comunismo
soviético (1917-1991) e o chinês (em vigor desde 1949). Muitos governos
comunistas entraram em colapso, por oposição popular nas décadas de 1980 e
1990. Em recente pesquisa da rádio BBC, que mobilizou grande parte da imprensa
inglesa, Marx foi eleito o filósofo mais importante de todos os tempos.
Luta de classes
Na base do pensamento de Marx
está a idéia de que tudo se encontra em constante processo de mudança. O motor
da mudança são os conflitos resultantes das contradições de uma mesma
realidade. Para Marx, o conflito que explica a história é a luta de classes.
Segundo o filósofo, as sociedades se estruturam de modo a promover os
interesses da classe economicamente dominante. No capitalismo, a classe
dominante é a burguesia; e aquela que vende sua força de trabalho e recebe
apenas parte do valor que produz é o proletariado.
O marxismo prevê que o
proletariado se libertará dos vínculos com as forças opressoras e, assim, dará
origem a uma nova sociedade. Segundo Marx, o conflito de classes já havia sido
responsável pelo surgimento do capitalismo, cujas raízes estariam nas
contradições internas do feudalismo medieval. Em ambos os regimes (feudalismo e
capitalismo), as forças econômicas tiveram papel central. “O moinho de vento
nos dá uma sociedade com senhor feudal; o motor a vapor, uma sociedade com o
capitalista industrial”, escreveu Marx.
A obra de Marx reúne uma grande
variedade de textos: reflexões curtas sobre questões políticas imediatas,
estudos históricos, escritos militantes – como O Manifesto Comunista, parceria
com Friedrich Engels – e trabalhos de grande fôlego, como sua obra-prima, O
Capital, que só teve o primeiro de quatro volumes lançado antes de sua morte. A
complexidade da obra de Marx, com suas constantes autocríticas e correções de
rota, é responsável, em parte, pela variedade de interpretações feitas por seus
seguidores.
Trabalho e alienação
Em O Capital, Marx realiza uma
investigação profunda sobre o modo de produção capitalista e as condições de
superá-lo, rumo a uma sociedade sem classes e na qual a propriedade privada
seja extinta. Para Marx, as estruturas sociais e a própria organização do
Estado estão diretamente ligadas ao funcionamento do capitalismo. Por isso,
para o pensador, a idéia de revolução deve implicar mudanças radicais e
globais, que rompam com todos os instrumentos de dominação da burguesia.
Marx abordou as relações
capitalistas como fenômeno histórico, mutável e contraditório, trazendo em si
impulsos de ruptura. Um desses impulsos resulta do processo de alienação a que
o trabalhador é submetido, segundo o pensador. Por causa da divisão do trabalho
– característica do industrialismo, em que cabe a cada um apenas uma pequena
etapa da produção –, o empregado se aliena do processo total.
Além disso, o retorno da produção
de cada homem é uma quantia de dinheiro, que, por sua vez, será trocada por
produtos. O comércio seria uma engrenagem de trocas em que tudo – do trabalho
ao dinheiro, das máquinas ao salário – tem valor de mercadoria, multiplicando o
aspecto alienante.
Por outro lado, esse processo se
dá à custa da concentração da propriedade por aqueles que empregam a
mão-de-obra em troca de salário. As necessidades dos trabalhadores os levarão a
buscar produtos fora de seu alcance. Isso os pressiona a querer romper com a
própria alienação.
Um dos objetivos da revolução
prevista por Marx é recuperar em todos os homens o pleno desenvolvimento
intelectual, físico e técnico. É nesse sentido que a educação ganha ênfase no
pensamento marxista. “A superação da alienação e da expropriação intelectual já
está sendo feita, segundo Marx”, diz Leandro Konder. “O processo atual se
aceleraria com a revolução proletária para alcançar, afinal, as metas maiores
na sociedade comunista.”
Aprendizagem para a mente, o
corpo e as mãos
Combater a alienação e a
desumanização era, para Marx, a função social da educação. Para isso seria
necessário aprender competências que são indispensáveis para a compreensão do
mundo físico e social. O filósofo alertava para o risco de a escola ensinar
conteúdos sujeitos a interpretações “de partido ou de classe”. Ele valorizava a
gratuidade da educação, mas não o atrelamento a políticas de Estado – o que
equivaleria a subordinar o ensino à religião. Marx via na instrução das
fábricas, criada pelo capitalismo, qualidades a ser aproveitadas para um ensino
transformador – principalmente o rigor com que encarava o aprendizado para o
trabalho. O mais importante, no entanto, seria ir contra a tendência
“profissionalizante”, que levava
as escolas industriais a ensinar apenas o estritamente necessário para o
exercício de determinada função. Marx entendia que a educação deveria ser ao
mesmo tempo intelectual, física e técnica. Essa concepção, chamada de
“onilateral” (múltipla), difere da visão de educação “integral” porque esta tem
uma conotação moral e afetiva que, para Marx, não deveria ser trabalhada pela
escola, mas por “outros adultos”. O filósofo não chegou a fazer uma análise
profunda da educação com base na teoria que ajudou a criar. Isso ficou para
seguidores como o italiano Antonio Gramsci (1891-1937), o ucraniano Anton
Makarenko (1888-1939) e a russa Nadia Krupskaia (1869-1939).
Para pensar
A
alienação de que fala Marx é conseqüência do afastamento entre os interesses do
trabalhador e aquilo que ele produz. De modo mais amplo, trata-se também do
abismo entre o que se aprende apenas para cumprir uma função no sistema de
produção e uma formação que realmente ajude o ser humano a exercer suas
potencialidades. Você já pensou se a educação, como é praticada a seu redor,
procura dar condições ao aluno para que se desenvolva por inteiro ou se
responde apenas a objetivos limitados pelas circunstâncias?
PEDAGOGIA
19- Martinho Lutero
Fundador do protestantismo foi um
dos responsáveis pela concepção de ensino público que serviu de modelo para a
escola moderna no Ocidente.
Foi de Lutero a idéia de dividir
a educação em três grandes ciclos (fundamental, médio e superior).
Frase de Martinho Lutero:
“Quando a
escola progride, tudo progride”
Martinho Lutero nasceu em 1483 em
Eisleben, norte da Alemanha. Seus pais queriam que fosse advogado,mas ele
procurou formação num mosteiro em Erfurt. Aos 25 anos, foi para a Universidade
de Wittenberg, onde se formou em estudos bíblicos. Numa viagem a Roma, ficou
escandalizado com os costumes do clero. Ao voltar, iniciou carreira de
professor e pregador, sob proteção do príncipe Frederico, o Sábio. Em 1517,
Lutero publicou suas 95 teses teológicas. Quatro anos depois foi excomungado
pelo papa Leão X e reafirmou suas convicções perante os governantes alemães, na
Dieta
(reunião parlamentar) de Worms,
de onde saiu proscrito. Após um ano refugiado, sob proteção de amigos, retomou
a vida religiosa em Wittenberg. Em 1525, casou-se com a ex-freira Katherina von
Bora. Nas duas últimas décadas de vida, ganhou prestígio popular, enquanto o
apoio dos governantes variava com as circunstâncias. Em 1546, morreu durante
visita a sua cidade natal.
Movido pela indignação e pela
discordância com os costumes da
Igreja de seu tempo, o monge
alemão Martinho Lutero foi o responsável pela reforma protestante, que originou
uma das três grandes vertentes do cristianismo (ao lado do catolicismo e da
Igreja Ortodoxa). O nascimento do protestantismo teve profundas implicações
sociais, econômicas e políticas. Na educação, o pensamento de Lutero produziu
uma reforma global do sistema de ensino alemão, que inaugurou a escola moderna.
Seus reflexos se estenderam pelo Ocidente e chegam aos dias de hoje.
A idéia da escola pública e para
todos, organizada em três grandes ciclos (fundamental, médio e superior) e
voltada para o saber útil nasce do projeto educacional de Lutero. “A distinção
clara entre a esfera espiritual e as coisas do mundo propiciou um avanço para o
conhecimento e o exercício funcional das coisas práticas”, diz o pastor Walter
Altmann, presidente da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil.
Venda de indulgências
Embora nunca tivesse planejado
uma cisão na Igreja, Lutero dedicou a maior parte de sua vida à polêmica
doutrinária em torno da fé cristã. Sua produção intelectual foi intensa e
erudita, e seus atos, graças ao surgimento da imprensa e do clima de
descontentamento social, ganharam vasta repercussão. Apesar da complexidade do
cenário, pode-se identificar dois fatores que desencadearam a dissidência de
Lutero.
O primeiro foi à venda de
indulgências pela Igreja. Segundo esse costume, que se iniciou na última fase
da Idade Média, os fiéis podiam comprar, de um representante do clero, parte da
absolvição de seus pecados. A prática era oficial, aprovada pelo papa e vinha
acompanhada de um ritual solene. O comércio de indulgências representava uma
espécie de resumo do que havia de mais condenável no comportamento da Igreja
daquele tempo: ganância, ostentação, arbitrariedade e mundanismo. As
deturpações do cristianismo incomodavam os poderes locais e repugnavam os intelectuais.
Lutero sempre havia pregado
contra as indulgências, mas o que o levou a realizar um protesto público, em
1517, foi a venda de uma indulgência especial, que oferecia privilégios
específicos, lançada pelo Vaticano para financiar a reconstrução da Basílica de
São Pedro. Contra ela, Lutero elaborou 95 teses, criticando as práticas
eclesiásticas, e afixou-as na porta da Igreja do Castelo de Wittenberg. Foi o
início do conflito entre o monge alemão e a autoridade papal.
Uma nova classe
A segunda grande inquietação de
Lutero tinha origem doutrinária e o atormentou durante seus anos de formação.
Ele não aceitava o princípio, então dominante no cristianismo, de que a justiça
divina se manifestava, no plano terreno, como um julgamento dos atos dos homens.
Para Lutero, isso produzia medo e tornava praticamente impossível o sentimento
espontâneo de amor a Deus. A indignação de Lutero só se dissipou quando, ao
interpretar os Evangelhos, concluiu que os homens vivem por uma graça de Deus e
que a justiça divina é revelada pela leitura das escrituras, de modo passivo e
independentemente dos méritos ou ações de cada um durante a vida. Foi o que se
tornou conhecido como doutrina da salvação pela fé.
A reivindicação de liberdade para
interpretar a Bíblia tornou-se não só um dos pilares da reforma protestante
como o princípio fundador do projeto educacional de Lutero, que valorizou a
alfabetização e o ensino de línguas – e, mais importante, pregou o acesso de
todos a esse conhecimento. Os renovadores religiosos defendiam a formação de
uma nova classe de homens cultos, dando origem ao conceito de utilidade social
da educação.
Lutero tinha um projeto inovador,
mas abominava a possibilidade de se tornar porta-voz de qualquer idéia ou
ambição revolucionária. Mesmo assim, o surgimento do protestantismo foi ao
encontro dos desejos da classe economicamente emergente de comerciantes, para
quem a educação representava uma possibilidade de aceitação e ascendência
social. Nas primeiras décadas do século 16, o Sacro Império Romano-Germânico
era um mosaico de principados mais ou menos independentes. Os interesses
político-econômicos do imperador, da Igreja e dos príncipes emperravam uns aos
outros. Os príncipes, menos obrigados ao poder papal do que o imperador, viram
em Lutero uma possibilidade de se afirmar politicamente contra a autoridade
central e de contestar os direitos da Igreja sobre riquezas que se encontravam
em seus territórios.
O fato de Lutero não acreditar
que a salvação da alma estivesse vinculada às ações durante a vida não
implicava descaso pelas coisas mundanas. Ao separar as esferas do poder
espiritual e do poder temporal, o líder religioso alemão atribuía ao último a
responsabilidade de administração da vontade de Deus – por isso a obediência
civil seria um dever moral e a rebelião um pecado. “A ligação entre os dois
mundos é a fé, porque os que crêem são também vocacionados para servir o
próximo na sociedade”, afirma o pastor Walter Altmann.
Instrução para fortalecer a
cidade
Tão importante quanto Lutero para
a educação foi Philipp Melanchthon (1497-1560). Durante o período que Lutero
passou impedido de se manifestar publicamente, Melanchthon foi o porta-voz da
causa reformista e se encarregou de reorganizar as igrejas dos principados que
aderiram ao luteranismo. Esse trabalho resultou no projeto de criação de um
sistema de escolas públicas, depois copiado em quase toda a Alemanha. A reforma
da instrução era uma das principais reivindicações das camadas mais pobres da
população, insatisfeitas com as más condições de vida e com o ensino escasso e
ineficaz oferecido pela Igreja. Esses foram alguns dos motivos da revolta
armada dos camponeses, sangrentamente reprimida em
1525. Tanto Melanchthon quanto
Lutero viam na educação um assunto do interesse dos governantes. “A maior força
de uma cidade é ter muitos cidadãos instruídos”, escreveu Lutero. Para isso,
foi criado um sistema que atendia à finalidade de preparar para o trabalho e à
possibilidade de prosseguir os estudos para elevação cultural. O currículo era
baseado nas ciências humanas, com ênfase na história.
Para pensar
A criação
de uma rede de ensino público foi planejada pelos reformadores luteranos a
pedido de governantes que perceberam a urgência de oferecer instrução ao povo.
O interesse dos príncipes era fortalecer seus domínios num tempo de constantes
hostilidades entre os Estados. “Lutero argumentou que o dinheiro investido em
educação seria menor que o gasto com armas e traria mais benefícios”, diz o
pastor Altmann. E você, que argumento utilizaria, hoje, a favor da educação
para todos?
PEDAGOGIA
20- Platão
O filósofo grego previu um
sistema de ensino que mobilizava toda a sociedade para formar sábios e
encontrar a virtude.
Há mais de 2 mil anos, Platão já
defendia instrução igual para meninos e meninas.
Frases de Platão:
"A
educação deve propiciar ao corpo e à alma toda a perfeição e a beleza que podem
ter"
"Ao
longo dos anos, os antigos encontraram uma boa receita para a educação:
ginástica para o corpo e música para a alma"
Platão nasceu por volta de 427
a.C. em uma família aristocrática de Atenas. Quando tinha cerca de 20 anos,
aproximou-se de Sócrates, por quem tinha grande admiração. Como a maioria dos
jovens de sua classe, quis entrar na política. Contudo, a oligarquia e a
democracia lhe desagradaram. Com a condenação de Sócrates à morte, Platão
decidiu se afastar de Atenas e saiu em viagem pelo mundo. Numa de suas últimas
paradas, esteve na Sicília, onde fez amizade com Dion, cunhado do rei de
Siracusa, Dionísio I. De volta a Atenas, com cerca de 40 anos, Platão fundou a
Academia, um instituto de educação e pesquisa filosófica e científica que
rapidamente ganhou prestígio. Três décadas depois, ele foi convidado por Dion a
viajar a Siracusa para educar seu sobrinho Dionísio II, que se tornara imperador.
A missão foi frustrada por intrigas políticas que terminaram num golpe dado por
Dion. Platão morreu por volta de 347 a.C. Já era um homem admirado em toda
Atenas.
Na história das idéias, Platão
foi o primeiro pedagogo, não só por ter concebido um sistema educacional para o
seu tempo, mas, principalmente, por tê-lo integrado a uma dimensão ética e
política. O objetivo final da educação, para o filósofo, era a formação do
homem moral, vivendo em um Estado justo.
Platão foi o segundo da tríade
dos grandes filósofos clássicos, sucedendo Sócrates (469-399 a.C.) e precedendo
Aristóteles (384-322 a.C.), seu discípulo. Como Sócrates, Platão rejeitava a
educação que se praticava na Grécia em sua época e que estava a cargo dos
sofistas, incumbidos de transmitir conhecimentos técnicos - sobretudo a
oratória - aos jovens da elite, para torná-los aptos a ocupar as funções
públicas. "Os sofistas afirmavam que podiam defender igualmente teses
contrárias, dependendo dos interesses em jogo", diz Sérgio Augusto Sardi, professor
da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. "Platão, ao
contrário, pensava em termos de uma busca continuada da virtude, da justiça e
da verdade."
Para Platão, "toda virtude é
conhecimento". Ao homem virtuoso, segundo ele, é dado conhecer o bem e o
belo. A busca da virtude deve prosseguir pela vida inteira - portanto, a
educação não pode se restringir aos anos de juventude. Educar é tão importante
para uma ordem política baseada na justiça - como Platão preconizava - que
deveria ser tarefa de toda a sociedade.
O ideal da escola pública
Baseado na idéia de que os
cidadãos que têm o espírito cultivado fortalecem o Estado e que os melhores
entre eles serão os governantes, o filósofo defendia que toda educação era de
responsabilidade estatal - um princípio que só se difundiria no Ocidente muitos
séculos depois. Igualmente avançada, quase visionária, era a defesa da mesma
instrução para meninos e meninas e do acesso universal ao ensino.
Contudo, Platão era um opositor
da democracia - há estudiosos que o consideram um dos primeiros idealizadores
do totalitarismo. O filósofo via no sistema democrático que vigorava na Atenas
de seu tempo uma estrutura que concedia poder a pessoas despreparadas para
governar. Quando Sócrates, que considerava "o mais sábio e o mais justo
dos homens", foi condenado à morte sob acusação de corromper a juventude,
Platão convenceu-se, de uma vez por todas, de que a democracia precisava ser
substituída.
Para ele, o poder deveria ser
exercido por uma espécie de aristocracia, mas não constituída pelos mais ricos
ou por uma nobreza hereditária. Os governantes tinham de ser definidos pela
sabedoria. Os reis deveriam ser filósofos e vice-versa. "Como pode uma
sociedade ser salva, ou ser forte, se não tiver à frente seus homens mais
sábios?", escreveu Platão.
Estudo permanente
A educação, segundo a concepção
platônica, visava a testar as aptidões dos alunos para que apenas os mais
inclinados ao conhecimento recebessem a formação completa para ser governantes.
Essa era a finalidade do sistema educacional planejado pelo filósofo, que
pregava a renúncia do indivíduo em favor da comunidade. O processo deveria ser
longo, porque Platão acreditava que o talento e o gênio só se revelam aos
poucos.
A formação dos cidadãos começaria
antes mesmo do nascimento, pelo planejamento eugênico da procriação. As
crianças deveriam ser tiradas dos pais e enviadas para o campo, uma vez que
Platão considerava corruptora a influência dos mais velhos. Até os 10 anos, a
educação seria predominantemente física e constituída de brincadeiras e
esporte. A idéia era criar uma reserva de saúde para toda a vida. Em seguida,
começaria a etapa da educação musical (abrangendo música e poesia), para se
aprender harmonia e ritmo, saberes que criariam uma propensão à justiça, e para
dar forma sincopada e atrativa a conteúdos de Matemática, História e Ciência.
Depois dos 16 anos, à música se somariam os exercícios físicos, com o objetivo
de equilibrar força muscular e aprimoramento do espírito.
Aos 20 anos, os jovens seriam
submetidos a um teste para saber que carreira deveriam abraçar. Os aprovados
receberiam, então, mais dez anos de instrução e treinamento para o corpo, a
mente e o caráter. No teste que se seguiria, os reprovados se encaminhariam
para a carreira militar e os aprovados para a filosofia - neste caso, os
objetivos dos estudos seriam pensar com clareza e governar com sabedoria. Aos
35 anos, terminaria a preparação dos reis-filósofos. Mas ainda estavam
previstos mais 15 de vida em sociedade, testando os conhecimentos entre os
homens comuns e trabalhando para se sustentar. Somente os que fossem
bem-sucedidos se tornariam governantes ou "guardiães do Estado".
O aprendizado como reminiscência
Platão defendia a idéia de que a
alma precede o corpo e que, antes de encarnar, tem acesso ao conhecimento.
Dessa forma, todo aprendizado não passaria de um esforço de reminiscência - um
dos princípios centrais do pensamento do filósofo. Com base nessa teoria, que
não encontra eco na ciência contemporânea, Platão defendia uma idéia que,
paradoxalmente, sustenta grande parte da pedagogia atual: não é possível ou
desejável transmitir conhecimentos aos alunos, mas, antes, levá-los a procurar
respostas, eles mesmos, a suas inquietações. Por isso, o filósofo rejeitava
métodos de ensino autoritários. Ele acreditava que se deveria deixar os
estudantes, sobretudo as crianças, à vontade para que pudessem se desenvolver
livremente. Nesse ponto, a pedagogia de Platão se aproxima de sua filosofia, em
que a busca da verdade é mais importante do que dogmas incontestáveis. O
processo dialético platônico - pelo qual, ao longo do debate de idéias,
depuram-se o pensamento e os dilemas morais - também se relaciona com a procura
de respostas durante o aprendizado. "Platão é do mais alto interesse para
todos que compreendem a educação como uma exigência de que cada um, professor
ou aluno, pense sobre o próprio pensar", diz o professor Sardi.
Para pensar
Platão
acreditava que, por meio do conhecimento, seria possível controlar os
instintos, a ganância e a violência. O acesso aos valores da civilização,
portanto, funcionaria como antídoto para todo o mal cometido pelos seres
humanos contra seus semelhantes. Hoje poucos concordam com isso; a causa
principal foram as atrocidades cometidas pelos regimes totalitários do século
20, que prosperaram até em países cultos e desenvolvidos, como a Alemanha. Por
outro lado, não há educação consistente sem valores éticos. Você já refletiu
sobre essas questões? Até que ponto considera a educação um instrumento para a
formação de homens sábios e virtuosos?
PEDAGOGIA
21- Sócrates
Para o pensador grego, só
voltando-se para seu interior o homem chega à sabedoria e se realiza como
pessoa.
Mesmo condenado à morte, o
filósofo não voltou atrás com suas idéias.
Frases de Sócrates:
"É
sábio o homem que pôs em si tudo que leva à felicidade ou dela se
aproxima"
"O
princípio dos raciocínios é constituído pela essência das coisas do mundo"
Sócrates nasceu em Atenas por
volta de 469 a.C. Adquiriu a cultura tradicional dos jovens atenienses,
aprendendo música, ginástica e gramática. Lutou nas guerras contra Esparta (432
a.C.) e Tebas (424 a.C.). Durante o apogeu de Atenas, onde se instalou a
primeira democracia da história, conviveu com intelectuais, artistas,
aristocratas e políticos. Convenceu-se de sua missão de mestre por volta dos 38
anos, depois que seu amigo Querofonte, em visita ao templo de Apolo, em Delfos,
ouviu do oráculo que Sócrates era "o mais sábio dos homens". Deduzindo
que sua sabedoria só podia ser resultado da percepção da própria ignorância,
passou a dialogar com as pessoas que se dispusessem a procurar a verdade e o
bem. Em meio ao desmoronamento do império ateniense e à guerra civil interna,
quando já era septuagenário, Sócrates foi acusado de desrespeitar os deuses do
Estado e de corromper os jovens. Julgado e condenado à morte por envenenamento,
ele se recusou a fugir ou a renegar suas convicções para salvar a vida. Ingeriu
cicuta e morreu rodeado por amigos, em 399 a.C.
Seu pensamento marca uma
reviravolta na história humana. Até então, a filosofia procurava explicar o
mundo baseada na observação das forças da natureza. Com Sócrates, o ser humano
voltou-se para si mesmo. Como diria mais tarde o pensador romano Cícero, coube
ao grego "trazer a filosofia do céu para a terra" e concentrá-la no
homem e em sua alma (em grego, a psique). A preocupação de Sócrates era levar
as pessoas, por meio do autoconhecimento, à sabedoria e à prática do bem.
Nessa empreitada de colocar a
filosofia a serviço da formação do ser humano, Sócrates não estava sozinho.
Pensadores sofistas, os educadores profissionais da época, igualmente se
voltavam para o homem, mas com um objetivo mais imediato: formar as elites
dirigentes. Isso significava transmitir aos jovens não o valor e o método da
investigação, mas um saber enciclopédico, além de desenvolver sua eloqüência,
que era a principal habilidade esperada de um político.
Sócrates concebia o homem como um
composto de dois princípios, alma (ou espírito) e corpo. De seu pensamento
surgiram duas vertentes da filosofia que, em linhas gerais, podem ser
consideradas como as grandes tendências do pensamento ocidental.
Uma é a idealista, que partiu de
Platão (427-347 a.C.), seguidor de Sócrates. Ao distinguir o mundo concreto do
mundo das idéias, deu a estas o status de realidade; e a outra é a realista,
partindo de Aristóteles (384-322 a.C.), discípulo de Platão que submeteu as
idéias, às quais se chega pelo espírito, ao mundo real.
O nascimento das idéias, segundo
o filósofo
Sócrates comparava sua função com
a profissão de sua mãe, parteira - que não dá à luz a criança, apenas auxilia a
parturiente. "O diálogo socrático tinha dois momentos", diz Carlos
Roberto Jamil Cury, professor aposentado da Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo. O primeiro corresponderia às "dores do parto", momento em
que o filósofo, partindo da premissa de que nada sabia, levava o interlocutor a
apresentar suas opiniões. Em seguida, fazia-o perceber as próprias contradições
ou ignorância para que procedesse a uma depuração intelectual. Mas só a
depuração não levava à verdade - chegar a ela constituía a segunda parte do
processo. Aí, ocorria o "parto das idéias" (expresso pela palavra
maiêutica), momento de reconstrução do conceito, em que o próprio interlocutor
ia "polindo" as noções até chegar ao conceito verdadeiro por
aproximações sucessivas. O processo de formar o indivíduo para ser cidadão e
sábio devia começar pela educação do corpo, que permite controlar o físico. Já
para a educação do espírito, Sócrates colocava em segundo plano os estudos
científicos, por considerar que se baseavam em princípios mutáveis. Inspirado
no aforismo "conhece-te a ti mesmo", do templo de Delfos, julgava
mais importantes os princípios universais, porque seriam eles que conduziriam à
investigação das coisas humanas.
Ensino pelo diálogo
Nas palavras atribuídas a
Sócrates por Platão na obra Apologia de Sócrates, o filósofo ateniense
considerava sua missão "andar por aí (nas ruas, praças e ginásios, que
eram as escolas atenienses de atletismo), persuadindo jovens e velhos a não se
preocuparem tanto, nem em primeiro lugar, com o corpo ou com a fortuna, mas
antes com a perfeição da alma".
Defensor do diálogo como método
de educação, Sócrates considerava muito importante o contato direto com os
interlocutores - o que é uma das possíveis razões para o fato de não ter
deixado nenhum texto escrito. Suas idéias foram recolhidas principalmente por
Platão, que as sistematizou, e por outros filósofos que conviveram com ele.
Sócrates se fazia acompanhar freqüentemente por jovens, alguns pertencentes às
mais ilustres e ricas famílias de Atenas. Para Sócrates, ninguém adquire a
capacidade de conduzir-se, e muito menos de conduzir os demais, se não possuir
a capacidade de autodomínio. Depois dele, a noção de controle pessoal se
transformou em um tema central da ética e da filosofia moral. Também se formou
aí o conceito de liberdade interior: livre é o homem que não se deixa
escravizar pelos próprios apetites e segue os princípios que, por intermédio da
educação, afloram de seu interior.
Opondo-se ao relativismo de
muitos sofistas, para os quais a verdade e a prática da virtude dependiam de
circunstâncias, Sócrates valorizava acima de tudo a verdade e as virtudes -
fossem elas individuais, como a coragem e a temperança, ou sociais, como a
cooperação e a amizade. O pensador afirmava, no entanto, que só o conhecimento
(ou seja, o saber, e não simples informações isoladas) conduz à prática da
virtude em si mesma, que tem caráter uno e indivisível.
Segundo Sócrates, só age
erradamente quem desconhece a verdade e, por extensão, o bem. A busca do saber
é o caminho para a perfeição humana, dizia, introduzindo na história do
pensamento a discussão sobre a finalidade da vida.
O despertar do espírito
O papel do educador é, então, o
de ajudar o discípulo a caminhar nesse sentido, despertando sua cooperação para
que ele consiga por si próprio "iluminar" sua inteligência e sua
consciência. Assim, o verdadeiro mestre não é um provedor de conhecimentos, mas
alguém que desperta os espíritos. Ele deve, segundo Sócrates, admitir a
reciprocidade ao exercer sua função iluminadora, permitindo que os alunos
contestem seus argumentos da mesma forma que contesta os argumentos dos alunos.
Para o filósofo, só a troca de idéias dá liberdade ao pensamento e a sua
expressão - condições imprescindíveis para o aperfeiçoamento do ser humano.
Para pensar
Ao eleger
o diálogo como método de investigação, Sócrates foi o primeiro filósofo a se
preocupar não só com a verdade mas com o modo como se pode chegar a ela. Eis
por que ele é considerado por muitos o modelo clássico de professor. Quando
você prepara suas aulas, costuma levar em conta a necessidade de ajudar seus
alunos a desenvolver procedimentos para que possam pensar por si mesmos?
PEDAGOGIA
22- Comênio
O filósofo tcheco combateu o
sistema medieval, defendeu o ensino de 'tudo para todos' e foi o primeiro
teórico a respeitar a inteligência e os sentimentos da criança.
A 'Didactica Magna', de Comênio,
marca o início da sistematização da pedagogia no Ocidente.
Frases de Comênio:
"Deve-se
começar a formação muito cedo, pois não se deve passar a vida a aprender, mas a
fazer"
"Age
idiotamente aquele que pretende ensinar aos alunos não quanto eles podem
aprender, mas quanto ele próprio deseja"
O nome Comênio é o
aportuguesamento da assinatura latina (Comenius) de Jan Amos Komensky, nascido
em 1592 em Nivnice, Morávia (então domínio dos Habsburgos, hoje República
Tcheca). O pensador Comênio foi filho único de um casal de membros do grupo
protestante Irmãos Boêmios. Na Universidade de Heidelberg (Alemanha), se
entusiasmou com as idéias de filósofos que criavam uma concepção de ciência
baseada no empirismo. Seguiu carreira religiosa e teve de fugir para a Polônia
quando, no início da Guerra dos 30 Anos, em 1618, o rei Ferdinando II decidiu
reimpor o catolicismo na Boêmia. Sua revolta com a situação o levou a escrever
obras filosóficas e pedagógicas satirizando a ordem vigente e propondo mudanças
radicais. Essas idéias seduziram pensadores da Inglaterra, que o convidaram a
trabalhar no país, mas o projeto foi abortado pela eclosão da Guerra Civil
Inglesa, em 1642. Tentativas de reforma escolar a pedido dos governos da Suécia
e da Hungria acabaram fracassando - em parte por causa da insistência do
pensador em divulgar sua "pansofia", sem sucesso - e ele voltou para
a Polônia. Comênio teve novamente de fugir de uma guerra civil e estabeleceu-se
em Amsterdã, onde permaneceu até morrer, em 1670. Por essa época, seus livros
de texto ilustrados para o aprendizado de línguas e ciências tinham se tornado
uma bem-sucedida novidade nas escolas da Europa.
Quando se fala de uma escola em
que as crianças são respeitadas como seres humanos dotados de inteligência,
aptidões, sentimentos e limites, logo pensamos em concepções modernas de
ensino. Também acreditamos que o direito de todas as pessoas - absolutamente
todas - à educação é um princípio que só surgiu há algumas dezenas de anos. De
fato, essas idéias se consagraram apenas no século 20, e assim mesmo não em
todos os lugares do mundo. Mas elas já eram defendidas em pleno século 17 por
Comênio, o pensador tcheco que é considerado o primeiro grande nome da moderna
história da educação.
A obra mais importante de Comênio,
Didactica Magna, marca o início da sistematização da pedagogia e da didática no
Ocidente. A obra, à qual o autor se dedicou ao longo de sua vida, tinha grande
ambição. "Comênio chama sua didática de ‘magna’ porque
ele não queria uma obra
restrita, localizada", diz João
Luiz Gasparin, professor do Departamento de Teoria e Prática da Educação
da Universidade Estadual de Maringá.
"Ela tinha de ser grande, como o mundo que estava sendo descoberto naquele
momento, com a expansão do comércio e das navegações."
No livro, o pensador realiza uma
racionalização de todas as ações educativas, indo da teoria didática até as
questões do cotidiano da sala de aula. A prática escolar, para ele, deveria
imitar os processos da natureza. Nas relações entre professor e aluno, seriam
consideradas as possibilidades e os interesses da criança. O professor passaria
a ser visto como um profissional, não um missionário, e seria bem remunerado
por isso. E a organização do tempo e do currículo levaria em conta os limites
do corpo e a necessidade, tanto dos alunos quanto dos professores, de ter
outras atividades.
Em busca da harmonia universal
Comênio viveu a maior parte da
vida cercado de guerras. Algumas delas, como a Guerra dos 30 Anos, de
protestantes contra católicos, lhe diziam respeito diretamente. Toda sua obra
foi marcada profundamente por isso, uma vez que o fim último de seu pensamento
era a compreensão universal, que uniria toda a humanidade. Ele perseguiu desde
a juventude a unificação da totalidade do conhecimento humano, porque imaginava
que ele era finito e imutável. A construção de uma enciclopédia do saber e sua
adaptação às capacidades infantis são o grande tema da pedagogia de Comênio, e
para sustentá-la ele criou uma base filosófica que denominou "pansofia",
a procura de um princípio básico que harmonizasse todo o saber. Ao contrário de
seu pensamento educacional, que suscitou interesse pela Europa afora, a
pansofia não teve seguidores.
Ruptura com a escolástica
Comênio era cristão protestante e
pertencia ao grupo religioso Irmãos Boêmios, ao qual se manteve vinculado por
toda a vida, tornando-se, em 1648, bispo dos morávios. Embora profundamente
religioso, o pensador propôs uma ruptura radical com o modelo de escola até
então praticado pela Igreja Católica, aquele voltado apenas para a elite e
dedicado primordialmente aos estudos abstratos. Ainda vigoravam as doutrinas
escolásticas da Idade Média, pelas quais todas as questões teóricas se
subordinavam à teologia cristã.
Comênio não foi o único pensador
de seu tempo a combater o pedantismo literário e o sadismo pedagógico, mas
ousou ser o principal teórico de um modelo de escola que deveria ensinar
"tudo a todos",
inclusive os portadores de deficiência mental e as meninas, na época excluídos
da educação. "Ele defendia o acesso irrestrito à escrita, à leitura e ao
cálculo, para que todos pudessem ler a Bíblia e comerciar", diz Gasparin.
Comênio respondia assim a duas urgências de seu tempo: o aparecimento da
burguesia mercantil nas cidades européias e o direito, reivindicado pelos
protestantes, à livre interpretação dos textos religiosos, proibida pela Igreja
Católica.
A obra de Comênio corresponde
também a outras novidades, entre elas "o despertar de uma nova concepção
de criança", como diz Gasparin. "Ele a trata em seus livros com muita
delicadeza, num tempo em que a escola existia sob a égide da palmatória",
continua o professor. "A educação era vista e praticada como um castigo e
não oferecia elementos para que depois as pessoas se situassem de forma mais ampla
na sociedade. Comênio reagiu a esse quadro com uma pergunta: por que não se
aprende brincando?"
Salvação da alma
Sob influência de seitas
protestantes e do filósofo inglês Francis Bacon (1561-1626), Comênio acreditava
que a salvação da alma poderia ser alcançada durante a vida terrena e que o
caminho para isso poderia ter a ajuda da ciência. Para ele, a criatura humana
correspondia ao ideal de perfeição. Comênio acreditava que, por ser dotado de
razão, o homem pode entender a si e a todas as coisas. Portanto, deve se
dedicar a aprender e a ensinar. Seguindo esse pensamento, Comênio conclui que o
mais importante na vida não é a contemplação e sim a ação, o "fazer".
No pensamento humanista do
pedagogo tcheco, a instrução e o trabalho diferenciavam o homem burguês do
homem feudal. Em sua trajetória, o novo indivíduo deveria imitar a natureza,
porque, emulando Deus e respeitando as aptidões de cada um, não haveria
possibilidade de erro. De Bacon, Comênio adotou o método empírico de explorar o
mundo, em contraposição às verdades impostas pelo ensino medieval. Pela
experimentação, ele acreditava que todos poderiam vir a enxergar a harmonia do
universo sob o caos aparente. "Comênio queria mudar a escola com a
didática e a sociedade com a educação", diz Gasparin."Era um grande
idealista."
Para pensar
A maior
contribuição de Comênio para a educação dos dias de hoje é, segundo o professor
Gasparin, a idéia de "trazer a realidade social para a sala de aula,
fazendo uso dos meios tecnológicos mais avançados à disposição". De tão
fascinado pela invenção da imprensa e pela possibilidade de disseminação de
conhecimento que ela representava, Comênio criou a expressão
"didacografia" para designar o método universal de ensino que ele
pretendia inaugurar. Nos dias de hoje, a tecnologia da informação seria capaz
de realizar essa revolução? Qual
é sua opinião?
PEDAGOGIA
23- B. F. Skinner
Para o psicólogo behaviorista
norte-americano, a educação deve ser planejada passo a passo para se obter os
resultados desejados
No behaviorismo, o comportamento é apenas um
conjunto de reações aos estímulos externos
Frases de Skinner:
“A
educação é o estabelecimento de comportamentos que serão vantajosos para o
indivíduo e para outros em algum tempo futuro”
“Quando
houver domínio sobre a ciência do comportamento, ela será a única alternativa
para a sociedade planejada”
Burrhus Frederic Skinner nasceu
em Susquehanna, no estado norteamericano da Pensilvânia, em 1904. Criado num
ambiente de disciplina severa, foi um estudante rebelde, cujos interesses, na
adolescência, eram a poesia e a filosofia. Formou-se em língua inglesa na
Universidade de Nova York antes de redirecionar a carreira para a psicologia,
que cursou em Harvard – onde tomou contato com o behaviorismo. Seguiram-se anos
dedicados a experiências com ratos e pombos, paralelamente à produção de
livros. O método desenvolvido para observar os animais de laboratório e suas
reações aos estímulos levou-o a criar pequenos ambientes fechados que ficaram
conhecidos como caixas de Skinner, depois adotadas para experimentos pela
indústria farmacêutica. Quando sua filha nasceu, Skinner criou um berço
climatizado, o que originou um boato de que a teria submetido a experiências
semelhantes às que fazia em laboratório. Em 1948, aceitou o convite para ser
professor em Harvard, onde ficou até o fim da vida. Morreu em 1990, em ativa
militância a favor do behaviorismo.
Nenhum pensador ou cientista do
século 20 levou tão longe a crença na possibilidade de controlar e moldar o
comportamento humano como o norte-americano Burrhus Frederic Skinner. Sua obra
é a expressão mais célebre do behaviorismo, corrente que dominou o pensamento e
a prática da psicologia, em escolas e consultórios, até os anos 1950.
O behaviorismo restringe seu
estudo ao comportamento (behavior, em inglês), tomado como um conjunto de
reações dos organismos aos estímulos externos. Seu princípio é que só é
possível teorizar e agir sobre o que é cientificamente observável. Com isso,
ficam descartados conceitos e categorias centrais para outras correntes
teóricas, como consciência, vontade, inteligência, emoção e memória – os
estados mentais ou subjetivos.
Os adeptos do behaviorismo
costumam se interessar pelo processo de aprendizado como um agente de mudança do
comportamento. “Skinner revela em várias passagens a confiança no planejamento
da educação, com base em uma ciência do comportamento humano, como
possibilidade de evolução da cultura”, diz Maria de Lourdes Bara Zanotto,
professora de psicologia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
Sem livre-arbítrio
O conceito-chave do pensamento de
Skinner é o de condicionamento operante, que ele acrescentou à noção de reflexo
condicionado, formulada pelo cientista russo Ivan Pavlov. Os dois conceitos
estão essencialmente ligados à fisiologia do organismo, seja animal ou humano.
O reflexo condicionado é uma reação a um estímulo casual. O condicionamento
operante é um mecanismo que premia uma determinada resposta de um indivíduo até
ele ficar condicionado a associar a necessidade à ação. É o caso do rato
faminto que, numa experiência, percebe que o acionar de uma alavanca levará ao
recebimento de comida. Ele tenderá a repetir o movimento cada vez que quiser
saciar sua fome.
A diferença entre o reflexo
condicionado e o condicionamento operante é que o primeiro é uma resposta a um
estímulo puramente externo; e o segundo, o hábito gerado por uma ação do
indivíduo. No comportamento respondente (de Pavlov), a um estímulo segue-se uma
resposta. No comportamento operante (de Skinner), o ambiente é modificado e
produz conseqüências que agem de novo sobre ele, alterando a probabilidade de
ocorrência futura semelhante.
Segundo Skinner, a ciência
psicológica – e também o senso comum – costumava, antes do aparecimento do behaviorismo,
apelar para explicações baseadas nos estados subjetivos por causa da
dificuldade de verificar as relações de condicionamento operante – ou seja,
todas as circunstâncias que produzem e mantêm a maioria dos comportamentos dos
seres humanos. Isso porque elas formam cadeias muito complexas, que desafiam as
tentativas de análise se elas não forem baseadas em métodos rigorosos de
isolamento de variáveis.
Nos usos que projetou para suas
conclusões científicas – em especial na educação –, Skinner pregou a eficiência
do reforço positivo, sendo, em princípio, contrário a punições e esquemas
repressivos. Ele escreveu um romance, Walden II, que projeta uma sociedade
considerada por ele ideal, em que um amplo planejamento global, incumbido de
aplicar os princípios do reforço e do condicionamento, garantiria uma ordem
harmônica, pacífica e igualitária. Num de seus livros mais conhecidos, Além da
Liberdade e da Dignidade, ele rejeitou noções como a do livre-arbítrio e
defendeu que todo comportamento é determinado pelo ambiente, embora a relação
do indivíduo com o meio seja de interação, e não passiva. Para Skinner, a
cultura humana deveria rever conceitos como os que ele enuncia no título da
obra.
Comportamento condicionado em
laboratório
Precursores da psicologia, como o
filósofo norte-americano William
James (1842-1910), já haviam
previsto a utilidade de um ramo da ciência que estudasse os comportamentos
puramente externos, mas a psicologia comportamental (behaviorismo) como a
conhecemos começou mesmo com o médico russo Ivan Pavlov (1849-1936). Motivado
por experiências com cães, Pavlov criou a teoria dos reflexos condicionados.
Foi o primeiro cientista a trabalhar na área psicológica que não se utilizou de
referências a estados subjetivos como instrumento teórico. O fundador do
behaviorismo como escola, porém, foi o psicólogo norteamericano John B. Watson
(1878- 1958), que formulou as estritas exigências metodológicas que deveriam
nortear seus seguidores. O compromisso de verificação concreta de hipóteses e a
recusa da introspecção aproximam o ideário de Watson do positivismo nas
ciências humanas. Watson foi o principal inspirador de Skinner, por sua vez o
maior divulgador do behaviorismo, prevendo a utilização de seus princípios na
psicoterapia, na educação e até na formulação de políticas públicas. O
behaviorismo clássico abraçou a idéia de que todo comportamento humano é
infalivelmente controlável por meio do padrão de estímulo-resposta. Mais
recentemente, o princípio da infalibilidade estatística foi substituído pelo da
probabilidade. No imaginário ficcional do século 20, a ênfase nos conceitos de
controle e planejamento aproximou o behaviorismo e as táticas dos regimes
totalitários – a terapia behaviorista, por exemplo, usou comumente choques
elétricos e substâncias químicas para condicionar comportamentos. Algumas das
principais metáforas do terror de estado do período fizeram referências a
métodos behavioristas, como os romances 1984 (de George Orwell) e A Laranja
Mecânica (de Anthony Burgess, adaptado para o cinema por Stanley Kubrick).
Para pensar
Ainda que
Skinner considerasse importante levar em conta as diferenças entre os alunos de
um mesmo professor, o behaviorismo se baseia fundamentalmente na
previsibilidade das reações aos estímulos e reforços. Seus objetivos
educacionais buscam resultados definidos antecipadamente, para que seja
possível, diante de uma criança ou adolescente, projetar a modelagem de um
adulto. Você considera importante, como professor, saber de antemão exatamente
o que deseja de seus alunos? É possível planejar o aprendizado em detalhes?
PEDAGOGIA
A obra do psicólogo ressalta o
papel da escola no desenvolvimento mental das crianças e é uma das mais
estudadas pela pedagogia contemporânea.
Lev Vygotsky morreu há mais de 70 anos, mas
sua obra continua em pleno processo de descoberta.
Frases de Lev Vygotsky:
“O saber
que não vem da experiência não é realmente saber”
“O
caminho do objeto até a criança e desta até o objeto passa por outra pessoa”
Lev Semenovitch Vygotsky nasceu
em 1896 em Orsha, pequena cidade perto de Minsk, a capital da Bielo-Rússia,
região então dominada pela Rússia (e que só se tornou independente em 1991, com
a desintegração da União Soviética, adotando o nome de Belarus). Seus pais eram
de uma família judaica culta e com boas condições econômicas, o que permitiu a
Vygotsky uma formação sólida desde criança. Ele teve um tutor particular até
entrar no curso secundário e se dedicou desde cedo a muitas leituras. Aos 18
anos, matriculou-se no curso de medicina em Moscou, mas acabou cursando a
faculdade de direito. Formado, voltou a Gomel, na Bielo-Rússia, em 1917, ano da
revolução bolchevique, que ele apoiou. Lecionou literatura, estética e história
da arte e fundou um laboratório de psicologia – área em que rapidamente ganhou
destaque, graças a sua cultura enciclopédica, seu pensamento inovador e sua
intensa atividade, tendo produzido mais de 200 trabalhos científicos. Em 1925,
já sofrendo da tuberculose que o mataria em 1934, publicou A Psicologia da
Arte, um estudo sobre Hamlet, de William Shakespeare, cuja origem é sua tese de
mestrado.
O psicólogo bielo-russo Lev
Vygotsky morreu há 74 anos, mas sua obra ainda está em pleno processo de
descoberta e debate em vários pontos do mundo, incluindo o Brasil. “Ele foi um
pensador complexo e tocou em muitos pontos nevrálgicos da pedagogia
contemporânea”, diz Teresa Rego, professora da Faculdade de Educação da
Universidade de São Paulo. Ela ressalta, como exemplo, os pontos de contato
entre os estudos de Vygotsky sobre a linguagem escrita e o trabalho da
argentina Emilia Ferreiro, a mais influente dos educadores vivos.
A parte mais conhecida da extensa
obra produzida por Vygotsky em seu curto tempo de vida converge para o tema da
criação da cultura. Aos educadores interessa em particular os estudos sobre
desenvolvimento intelectual. Vygotsky atribuía um papel preponderante às
relações sociais nesse processo, tanto que a corrente pedagógica que se
originou de seu pensamento é chamada de socioconstrutivismo ou
sociointeracionismo.
O papel do adulto
Todo aprendizado é
necessariamente mediado – e isso torna o papel do ensino e do professor mais
ativo e determinante do que o previsto por Piaget e outros pensadores da
educação, para quem cabe à escola facilitar um processo que só pode ser
conduzido pelo próprio aluno. Segundo Vygotsky, ao contrário, o primeiro
contato da criança com novas atividades, habilidades ou informações deve ter a
participação de um adulto. Ao internalizar um procedimento, a criança “se
apropria” dele, tornando-o voluntário e independente.
Desse modo, o aprendizado não se
subordina totalmente ao desenvolvimento das estruturas intelectuais da criança,
mas um se alimenta do outro, provocando saltos de nível de conhecimento. O
ensino, para Vygotsky, deve se antecipar ao que o aluno ainda não sabe nem é
capaz de aprender sozinho, porque, na relação entre aprendizado e
desenvolvimento, o primeiro vem antes. É a isso que se refere um de seus
principais conceitos, o de zona de desenvolvimento proximal, que seria a
distância entre o desenvolvimento real de uma criança e aquilo que ela tem o
potencial de aprender – potencial que é demonstrado pela capacidade de
desenvolver uma competência com a ajuda de um adulto. Em outras palavras, a
zona de desenvolvimento proximal é o caminho entre o que a criança consegue
fazer sozinha e o que ela está perto de conseguir fazer sozinha. Saber
identificar essas duas capacidades e trabalhar o percurso de cada aluno entre
ambas são as duas principais habilidades que um professor precisa ter, segundo
Vygotsky.
Expansão dos horizontes mentais
Como Piaget, Vygotsky não
formulou uma teoria pedagógica, embora o pensamento do psicólogo bielo-russo,
com sua ênfase no aprendizado, ressalte a importância da instituição escolar na
formação do conhecimento. Para ele, a intervenção pedagógica provoca avanços
que não ocorreriam espontaneamente. Ao formular o conceito de zona proximal,
Vygotsky mostrou que o bom ensino é aquele que estimula a criança a atingir um
nível de compreensão e habilidade que ainda não domina completamente,
"puxando" dela um novo conhecimento. "Ensinar o que a criança já
sabe desmotiva o aluno e ir além de sua capacidade é inútil", diz Teresa
Rego. O psicólogo considerava ainda que todo aprendizado amplia o universo
mental do aluno. O ensino de um novo conteúdo não se resume à aquisição de uma
habilidade ou de um conjunto de informações, mas amplia as estruturas
cognitivas da criança. Assim, por exemplo, com o domínio da escrita, o aluno
adquire também capacidades de reflexão e controle do próprio funcionamento
psicológico.
Para pensar
Vygotsky atribuiu muita
importância ao papel do professor como impulsionador do desenvolvimento
psíquico das crianças. A idéia de um maior desenvolvimento conforme um maior
aprendizado não quer dizer, porém, que se deve apresentar uma quantidade
enciclopédica de conteúdos aos alunos. O importante, para o pensador, é
apresentar às crianças formas de pensamento, não sem antes detectar que
condições elas têm de absorvê-las. E você? Já pensou em elaborar critérios para
avaliar as habilidades que seus alunos já têm e aquelas que eles poderão
adquirir? Percebe que certas atividades estimulam as crianças a pensar de um
modo novo e que outras não despertam o mesmo entusiasmo?
Nenhum comentário:
Postar um comentário